Entrevista

Conversa da Semana com Marleide Cunha

A gestão municipal atual é opressora.

O Portal do RN inicia hoje o seu espaço de entrevistas, intitulado Conversa da Semana. Todos os sábados, um convidado apresentará informações sobre questões da área em que atua, falará sobre temas em destaque bem como apresentará suas percepções sobre assuntos propostos por nossos repórteres. Na edição inaugural, a professora Maria Marleide Cunha, presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Mossoró (SINDISERPUM) detalha como foram os 39 dias da greve dos docentes da rede municipal de ensino, fala sobre o que mais lhe feriu naquela batalha, analisa aspectos do movimento grevista, projeta como serão embates futuros, comenta sobre ter tido o seu nome enaltecido por grande parcela dos professores e da população e revela se acionará judicialmente aqueles que tentaram macular sua honra durante os atos realizados na greve. Marleide Cunha é professora concursada das redes estadual e municipal de ensino. Licenciada em Pedagogia, é mestre em Educação, com trabalho na área de gestão da educação.

Por Márcio Alexandre

Portal do RN – Marleide, quais foram os pontos que tornaram as tratativas com a prefeitura para o fim da greve dos professores tão difíceis?

Marleide Cunha – Em nível de município, essa greve de 39 dias foi a mais duradoura que nós tivemos, sendo ela específica de professores. No SINDISERPUM, tivemos outras greves mais longas de outras categorias. Foi uma greve bastante dura, mas que conseguiu a união dos professores, daquele grupo determinado em defender os seus direitos, em defender a profissão docente, em não aceitar que o município de Mossoró, através da gestão atual, de Rosalba Ciarlini, que ela humilhasse professor. Cada ato da gestão gerava também uma resposta dos professores, uma resposta com bastante indignação. E nós também sofremos muito com isso. Sofremos, mas não baixamos a cabeça. Essa greve teve também um outro aspecto muito importante que se diferenciou de todas as que nós vivenciamos anteriormente: nós não fizemos uma greve onde o foco foi só a pauta e o conflito com o município, uma greve onde as atividades não foram só atos públicos concentrados na frente da prefeitura, ou acampamentos, como fazíamos anteriormente. Qual foi o diferencial? Nós fomos para as comunidades, nós fomos para frente das escolas e contamos com o apoio da comunidade.

Foi uma greve bastante dura, mas que conseguiu a união dos professores, daquele grupo determinado em defender os seus direitos

PRN – E o que isso trouxe de ganho para o movimento?

MC – Acho que foi por causa disso que a greve conseguiu uma repercussão muito positiva da sociedade, em ter a população do nosso lado, porque nós demos voz às pessoas. Nós demos voz aos pais, mães, aos alunos, aos cidadãos que passavam no momento em que nós estávamos na frente das escolas fazendo atividades. E, com isso, as pessoas puderam cobrar tudo. Tanto é que cobravam o que estava faltando da educação como também outras coisas que estavam faltando no bairro. Outro fator importante é que hoje nós temos as redes sociais. Antes a gente tinha mais dificuldade em ver a repercussão das coisas. A gente dependia muito da imprensa. E a imprensa local, como toda imprensa também, tem gente que se compromete com o jornalismo, com a notícia, com a imparcialidade. Mas tem também aqueles que servem a algum interesse específico. Então nós temos as redes sociais a nosso favor. Então pudemos expressar essa voz da comunidade. As mães cobrando da prefeitura que resolvesse o problema da greve. Os estudantes pressionando. Lembro bem os alunos do Nono Ano dizendo que os sonhos deles estavam sendo retirados pela prefeitura porque eles sonham entrar no IFRN, e eles estavam perdendo aula com a greve, perdendo a oportunidade, perdendo nas chances que eles teriam. Então, isso deixou a prefeitura bastante indignada, e aí a greve se estendeu.

PRN – Como foi tomada a decisão de recorrer ao Ministério Público?

MC – Quando o sindicato viu que a prefeitura não queria dialogar, que o município não estava se preocupando com as aulas, quem estava se preocupando eram os professores, o sindicato recorreu ao Ministério Público. Nós fomos, fizemos acordo, e fomos lá de boa-fé. Com o acordo construído pelo promotor, encerramos a greve no outro dia com o compromisso de repor as aulas. O município, se pensasse na educação, teria resolvido o conflito naquele momento. Acabou a greve, voltaria tudo ao normal nas salas de aula. Mas a gestão municipal atual é uma gestão opressora, é uma gestão que não aceita ser desafiada ou desobedecida. É como se todos nós fôssemos vassalos de um grupo e tivéssemos que obedecer às ordens dela. Os professores não são escravos, não são vassalos, não vão aceitar ser acorrentados. O conflito que poderia ter sido resolvido com o fim da greve ele se ampliou porque o município descontou os salários indevidamente.

Os professores não são escravos, não são vassalos, não vão aceitar ser acorrentados.

PRN – Como você classificaria esse gesto de desconto dos salários?

MC – Um total ato de abuso de poder, um total ato de vingança, de ressentimento, que fere todos os princípios da gestão pública. Feriu o interesse público e tudo mais. Então nós continuamos defendendo o que acreditávamos e mais ainda defendendo a dignidade do professor.

PRN – O sindicato tentou, logicamente, dialogar com a prefeitura, enviou ofícios, que foram ignorados solenemente. Uma reunião ainda chegou a ser agendada, mas cancelada depois pela prefeitura sob alegativa de que parentes dos secretários estavam doentes. Ficou uma sensação de que a prefeitura não queria reconhecer o sindicato como legítimo representante dos trabalhadores que estavam em greve?

MC – Olha, a prefeitura tentou desarticular, dividir a categoria. O objetivo da gestão não era só a questão da greve e dos salários, o objetivo da gestão era enfraquecer o sindicato, esse era o objetivo principal. Para enfraquecer o sindicato ela tinha que mexer naquilo que era mais forte no ser humano, a sua sobrevivência. Quando ela corta os salários, ela tira da pessoa o seu sustento. Ela acreditou que pela necessidade de sobrevivência os professores iriam lá se ajoelhar. Ela achou que os professores iriam se humilhar para ter seus salários, que é direito de todo trabalhador. Então, ela queria que os professores assinassem aquele termo para poder ter seus salários.

Ela acreditou que pela necessidade de sobrevivência os professores iriam lá se ajoelhar.

PRN – Por que o sindicato desaconselhou a assinatura do termo individual?

MC – No nosso entendimento era que você assinar um termo individual prometendo individualmente repor a aula, era um gesto que mostraria para a sociedade que o professor precisa assinar um papel para repor as suas aulas, para cumprir seus compromissos. Nós sempre assumimos o compromisso de reposição de aulas em todas as atividades que deixamos de ministrar as aulas. Se for numa parada, se for numa greve, os professores estão sempre dispostos em repor a aula.

A gestão tentou mostrar para a sociedade que professores não merecem confiança e teriam que assinar um termo prometendo repor as aulas. A gente vê isso com bastante preocupação. Com muita preocupação. Uma gestão pública revelar para a sociedade ou estimular a desconfiança, o descrédito nos seus professores. Os professores sempre assumiram o compromisso de repor as aulas, desde o início da greve. Reassumimos esse compromisso no final da greve quando foi feito o acordo no Ministério Público. Depois, reafirmamos o compromisso quando fizemos o termo coletivo em contraposição ao termo individual que a prefeitura queria que os professores assinassem.

PRN – Por que então um termo coletivo sugerido pelo sindicato?

MC – Porque a sociedade precisa confiar nos seus professores. Se não faz isso é uma sociedade doente, uma sociedade que volta à barbárie e isso é muito triste porque é a educação que nos humaniza, é a educação que nos torna pessoas com capacidade de viver em sociedade, de nos relacionarmos uns com os outros. O município, por sua vez, como é uma gestão opressora, essa gestão atual, então ele tenta quebrar todas as forças que tenham uma unidade para lhe enfrentar e no momento quem enfrenta a gestão Rosalba Ciarlini é o SINDISERPUM. Tudo que é condenável o município fez durante essa greve para tentar desacreditar esse sindicato. Usaram os meios de comunicação que eles tinham, utilizaram o jornal que eles tem o controle. Além do sindicato, tentaram denegrir a minha imagem. Eles mexeram com minha vida profissional. Tentaram colocar a sociedade contra nós. Tentaram plantar uma semente de desconfiança. Sabe, tudo tipo de estratégia qye uma pessoa de bem condenaria essa gestão fez.

Tudo que é condenável o município fez durante essa greve para tentar desacreditar esse sindicato.

PRN – Contra o sindicato, qual foi o fato mais desleal que a prefeitura utilizou nessa greve?

MC – Foi o desconto dos salários dos professores. E por que? Porque esse desconto mostrou esse sentimento mesquinho da gestão de não se posicionar enquanto gestão pública que tem o dever de defender e de preservar o interesse público, de agir com legalidade, com impessoalidade, com publicidade, com eficiência. O município descontar os salários dos professores, ele enterrou, ignorou, todos esses princípios. E por que ele fez isso: A gestão fez isso simplesmente para se vingar dos professores que fizeram a greve. Então, ela enterrou aquilo que é da gestão pública e trouxe para o lado pessoal. Foi um atentado não só ao sindicato, mas um atentado à democracia , um atentado ao respeito, um atentado à sociedade. Outro ponto que acho também que foi um ataque foi o desrespeito às instituições porque nós sentamos numa audiência convocada pelo Ministério Público, com o promotor intermediando, construindo o termo de acordo com as condições para o fim da greve e em nenhum momento o município, as pessoas que estavam lá representando o município – e tinham vários, não disseram que pretendiam descontar os salários.

PRN – Então eles agiram de má-fé?

MC – Sim, eles agiram de má-fé. Por que? Por que se eles tivesse falado sobre a disposição de cortar os salários, não haveria acordo de reposição de aulas. Então, eles afiram de má-fé, porque tanto nós como o próprio promotor entendemos que o calendário de reposição de aulas era condição para terminar a greve e ficaria tudo normal e não se descontaria. Ao fazer isso, ao descontar os salários, o município atentou contra o sindicato e atentou também contra as instituições, brincou, desrespeitou. E eu disse isso ao doutor Olegário Gurgel (promotor de justiça) na última audiência na Justiça, que foi já com a juíza. Disse para ele que o que o município fez contra os professores não foi só contra os professores, foi também contra o Ministério Público, um desrespeito ao Ministério Público. E ele próprio disse que quando foi feio o calendário de reposição de aulas subtendia-se que para quem estava ali de boa-fé de que não haveria desconto. Como a gente respeita as instituições democráticas, a gente entende que quando se senta numa mesa de negociação, a gente precisa confiar naquilo que está sendo discutido porque se não for assim, a gente vai viver numa sociedade em que todo mundo desconfia de todo mundo. Como um acordo vai ser construído se você não consegue acreditar que o outro está de boa-fé. Então foi muito grave esse ato insano, vingativo, abusivo, do município de Mossoró nessa gestão Rosalba Ciarlini. É tanto que foi a primeira vez que isso aconteceu. É bom que fique na história porque serve também de aprendizado. Tanto pra gente, quanto para eles quanto para gestões futuras.

Sim, eles agiram de má-fé.

PRN – E para você, qual foi o ato perpetrado pela prefeitura ou pelos vereadores, que mais a atingiu na honra, na dignidade?

MC – O que me chocou foi o título de persona non grata. Eu fiquei sem entender. E por que me chocou? Porque eu comecei a ensinar aos 17 anos. E passei a minha vida toda na educação, trabalhando e defendendo a educação, o direito das crianças aprenderem, o direito dos professores. Depois atuei bastante denunciando injustiças, sempre pensando no bem da coletividade. De repente, a Câmara Municipal diz que eu sou uma persona non grata em Mossoró. Aí a gente fica pensando: por que? Qual o critério? E isso realmente me chocou porque é uma mancha na minha história. Uma história que sempre foi baseada em princípios sólidos. Eu aprendi com meus pais, com toda dificuldade financeira que a gente viveu, mas eu aprendi que a honestidade, a verdade, devem estar acima de tudo. Sempre estudei, sempre trabalhei dois expedientes, dois vínculos. A vida toda decidida a nunca passar por cima de ninguém e de repente fica essa mancha na história, porque eu considero uma mancha. As pessoas dizem: você deveria receber como um prêmio. Certo, mas é um fato que está lá. Na verdade, não recebi até hoje nada oficialmente confirmando esse título. Eu estou recebendo convites da Câmara Municipal para participar de mesas, de audiências, como se nada tivesse acontecido. Se eu sou persona non grata, como eu que eu vou para lá, vou para uma mesa? Tenho aqui três ou quatro convites para participar de mesas, de audiências públicas. Até agora eu não sei qual a questão concreta disso. Por isso que a intenção foi somente manchar a questão da imagem, tentar criar uma ideia de conduta ruim,, condenável,. Alguma coisa nesse sentido, mas a nossa vida é uma vida, construída, com nossas atitudes, nosso modo de pensar, de se posicionar na sociedade em diferentes momentos, o que a gente é não é só nosso discurso, é o discurso junto com a prática e as pessoas relacionam isso. O efeito que os vereadores esperavam do persona non grata foi o contrário. Causou muita repercussão. Pessoas comuns condenando esse ato. Porque que os movimentos sociais condenem, a gente já espera. Que os sindicatos condenem também. Mas o que eles não esperavam era que o povo mesmo, pessoas comuns do dia a dia, se indignassem. Pra mim, nesse ponto foi muito positivo, por ver, por entender que a sociedade não está cega para todas as injustiças, que a sociedade percebe quando a injustiça é desproporcional.

PRN – Você foi alvo de muitos ataques. O que lhe deu forças para não esmorecer nenhum minuto?

MC – Eu vivi dois meses muito difíceis. Nós tivemos dois meses de greve. Na verdade, eu preciso destacar aqui que tudo isso acontece porque Márcio nós protocolamos ofício em dezembro. Nós esperamos três meses para que a prefeitura respondesse a um ofício. Nesse intervalo, nós mandamos vários outros ofícios pedindo ao município uma resposta, uma audiência, o município ignorou. Nós entramos numa greve, passamos mais de um mês pedindo ao município uma negociação  e nada, nenhuma resposta e tudo só foi encerrar no Ministério Público, aquela história que todo mundo já conhece. Então, o período da greve, o período pós-greve mais ainda foi muito difícil. O que é que me deu força? A convicção de que nós estávamos com a verdade, a convicção de que a gente estava lutando  por uma coisa que está na lei, que é legal. Não tinha um ponto da pauta que a gente dissesse assim: não, é uma nova conquista, nós estamos querendo algo novo, algo a mais, não tinha. Todos os pontos da pauta já estavam definidos em lei: o piso salarial (lei federal), a gestão democrática (lei municipal, plano municipal de educação), décimo quarto salário (lei municipal), progressões (lei do plano de carreira), então, tudo estava já definido em lei e que o município estava desrespeitando.  Então, se nós estávamos com a verdade, e o que a gente estava pedindo já estava estabelecido em lei, não tinha porque a gente admitir a opressão. E nós não podíamos fazer isso porque se os professores perdessem essa guerra contra o município de Mossoró  então não só aqui mas em vários municípios, na luta dos professores, aqui ia ter repercussão também entre os outros servidores, aí a opressão iria se instalar de vez.

PRN – Por que?

MC – Porque eles iriam pensar assim: ora, se nem os professores conseguiram, se a prefeitura conseguiu fazer tudo isso, descontar salários, e os professores tiveram que aceitar, então quem somos nós que não temos a força que os professores tem, para poder enfrentar essa gestão. Então, a greve iria pro ralo. Não só o direito de greve, mas a nossa esperança de enfrentar um poder opressor iria ficar muito desgastado. Então foi pensando nisso  que todo tempo eu dizia: nós não podemos esmorecer, nós estamos com a verdade, nós vamos vencer, vamos vencer com a dignidade, a nossa dignidade não pode ser atingida. Porque se você perde a dignidade você perde a sua condição de lutar de enfrentar as dificuldades. E graças a Deus conseguimos enfrentar com bastante unidade, com sofrimento, mas com as pessoas dizendo: eu confio no meu sindicato. Teve professor quem quando o diretor veio para assinar (o termo individual), professor que tinha só esse salário, que foi descontado, ele chegou para o diretor e disse: não me venha com esse termo, que eu não vou assinar, porque eu confio no meu sindicato. Quando o sindicato disser, se disser, que eu tenho que assinar, eu assino. Enquanto o sindicato disser que eu não devo assinar, eu vou passar dificuldade, mas eu não assino. E foi isso também que fez com que na assembleia a gente tivesse com aquela sensação de vitória. Talvez que não vivenciou não compreenda, mas quem vivenciou esse processo compreende que foi uma vitória e sabe que sofreu, mas que ele não perdeu a dignidade. E no final da contas ficou provado que quem estava errado era o município de Mossoró. Então as pessoas ainda estão sofrendo porque estão com as contas para pagar mas estão também com sua autoestima elevada, esse é um fator muito importante.

PRN – Em agosto se voltam as discussões para o cumprimento de 0.42% de diferença do reajuste do piso. Quais as perspectivas para esse novo embate, sobretudo após um processo tão espinhoso?

MC – Antes de responder isso, só quero relembrar que essa coisa do município, o ódio, o rancor, eu chamo de ódio porque eles tem um ódio muto grande do sindicato, dos professores e isso era tão forte neles por terem recebido esse tipo de resposta do professor: eu não vou assinar. Então, o que eles queriam fazer de qualquer forma era deixar esse sindicato desacreditado. Eles não admitiam que o coletivo fosse mais forte que o individual. Quando sentou na mesa na audiência, o município até queria repor os salários, disse que já tinha começado, mas a questão principal deles era devolver o salário mas com o professor se ajoelhando individualmente para receber esse salário. Eles não conseguiram isso e deve ter ficado entalado. A questão de como vai ser – tem audiência marcado para primeiro de agosto – eu espero que não desmarquem. E na verdade, eu não sei muito ainda. Acho que a gente vai construir. A greve terminou. Esperamos que o município cumpra a decisão judicial. Temos um processo de diálogo com os professores e nós vamos vendo. Vamos fazer assembleias. Vamos ver o que nós vamos construir a partir da resposta que o município vai dar. Nós sabemos é que precisamos lutar enquanto nós tivermos possibilidades para lutar por essa questão do piso salarial. O município está tirando 0.42% que o número pode não ser alto, mas o valor que está implícito nisso, o valor simbólico é muito forte porque o município de Mossoró está deixando os professores abaixo do piso, no subsolo, vamos dizer assim. Vamos usar essa metáfora: é como se nós valêssemos menos que o limite. Não vamos admitir. Por que? Porque admitir que tenhamos um valor menor que o piso nacional e admitir o desmonte da carreira, que nós lutamos tanto para conquistar. Nós estamos em tempos que temos que valorizar. Aliás, nós tivemos um tempo de valorização e agora estamos vivendo um processo grande de desvalorização, é um retrocesso enorme e precisamos lutar contra isso, resistir novamente, construir novamente as forças para conseguir a valorização dos professores, da educação. Eu não tenho a receita e não sei como vai ser, mas sei que n´s temos um ponto de partida e o ponto de partida e defender o piso salarial. Se o reajuste foi de 4.17% esse reajuste é o mínimo e o município não pode dar menos que o mínimo.

Então, o que eles queriam fazer de qualquer forma era deixar esse sindicato desacreditado.

PRN – Você acha que o que você sofreu de ataques foi além do que deveria ter sido feito a você pela condição de presidente do sindicato e, por isso, em algum momento cogitou processar algum dos que lhe atacaram tanto?

MC – Acho que foi além, houve ataque pessoal, mas não passou pela minha cabeça processar alguém por isso, porque Márcio é o seguinte: existem momentos de conflito e eu disse isso na reunião com a secretaria de Educação, no Ministério Público, quando a fala deles é de muito ressentimento, de que sofreram agressões e eu disse: e as nossas? Nós também sofremos agressões. Os professores sofreram. Eu sofri muito. E no momento de conflito e de acirramento desse conflito, é natural a exaltação, os ânimos se alterarem, como eu entendo como natural, eu entendo que o conflito tem uma hora de acabar. Quem não entende são eles. Então não passou por minha cabeça processar ninguém. Na verdade foi muito atingida. Muita gente me mandou mensagem dizendo que tudo aquilo que estava acontecendo não era contra o sindicato, era contra a presidente, a pessoa de Marleide, que eles queriam me desacreditar  perante a sociedade. Os professores diziam: Marleide está claro que é contra você.

PRN – Parece que teve efeito inverso. Começou-se a falar muito em seu nome, inclusive para concorrer a cargos eletivos. O que você pensa sobre isso, o que alimenta dessa expectativa?

MC – Olha, começou-se realmente a falar. Eu acho que quando alguém se destaca por alguma coisa as pessoas fazem logo uma relação de que vai querer ser candidato. Eu confesso a você que em nenhum momento não passou pela minha cabeça. Não vou mentir para você que as pessoas não dizem que eu vá ser candidata a vereadora, que se eu fosse candidata votaria, que eu poderia representar as pessoa além do sindicato. Mas eu vivi todos esses dias exclusivamente com essa questão da greve dos professores. Não pensei em nada dessa questão de política, de candidatura. Pensei só em resolver a questão da greve. Não sou uma pessoa que me deslumbro com as coisas, quem estiver pensando isso pode tirar o cavalinho da chuva. Não sou uma pessoa que gosta que as pessoas estejam elogiando -claro que elogios fazem bem – mas também elogios de mais fazem mal. Acho que temos que ter bem os pés no chão. Eu sei entender quando algumas coisas são devido ao momento ao contexto em que estamos vivendo e procuro ser racional. Então não pensei, não me deixei levar sobre isso. Nós temos um vereador na Câmara Municipal e não está passando na minha cabeça essa questão não.

PRN – Parece que a relação entre SINDISERPUM e a atual gestão é mais difícil que entre o sindicato em outras gestões. Por que isso acontece?

MC – A relação é mais difícil porque essa gestão é mais opressora. A gestão que tenta fazer com que as pessoas façam o que ela quer através do medo é essa gestão. E como ela é a mais opressora ela tem sim que ter um enfrentamento maior. E eu não me abato. Eles podem fazer o que quiserem. É eles fazendo e eu respondendo.

PRN – Que outro apoio o sindicato e você receberam, fora aquele dos pais, dos alunos?

MC – você tocou num ponto importante. Acho que o SINDISERPUM ficou sozinho nessa batalha contra a prefeitura. Ficou de um lado gestão, o poder do município contra nós. Uma luta de Davi contra Golias. Não percebi apoio firme de outras instituições, nem do campo da esquerda. Nós tivemos apoio dos pais, dos alunos, mas não tivemos apoio das instituições que representam a classe trabalhadora em outros setores.

PRN – Isso já seria reflexo do que temos do ponto de vista nacional, de uma sociedade dividida, fragmentada, a partir, por exemplo, do que fez o presidente com a população, colocando uns contra os outros?

MC – Acho que pode ser. As pessoas estão com medo de se posicionar. A gente percebia até nas postagens, nas curtidas. A gente não via outras pessoas de fora curtindo as postagens do sindicato. Talvez eu até seja criticada por estar dizendo isso, mas como não gosto de mentiras, eu falo sempre a verdade, eu senti falta até disso, de as pessoas compartilhar nossa indignação, nosso sofrimento. Talvez seja por conta do contexto atual do país, do incentivo ao individualismo, mas acho que não justifica. Porque os professores da luta estavam passando por cima do individual pelo coletivo. Porque então outros setores não chegaram junto? Outros setores que sofrem opressão da gestão atual não chegaram junto.

PRN – Como você avalia a atual legislatura atual da Câmara Municipal?

MC – Eu não vejo a Câmara Municipal cumprindo com seu papel, nem na passada nem nessa. Eu vejo alguma pessoas, alguns vereadores, e mais os ligados à oposição, tentando fiscalizar a gestão. Agora é muito complicado você ter apenas a oposição cumprindo o seu papel legislativo. E qual o papel de um vereador? Não é de estar furando fila da saúde para pegar ficha para dar a quem vota nele. È de fiscalizar o Executivo. Nós não vemos essa fiscalização. Para se ter uma ideia os vereadores não vão sair  livres nesse processo que vivenciamos nesse conflito. E começou de lá. Os vereadores da situação não deram a chance aos servidores públicos de tentar uma forma de modificar aquele projeto de lei do reajuste. Quem enfrentou a greve foram os professores, mas todos os servidores municipais foram prejudicados com a lei que foi aprovada no dia 12 de março. Que foi um projeto de lei enviado próximo a período de carnaval e votado em regime de urgência. Fomos para a Câmara Municipal porque queríamos que eles dissessem: não, não vamos votar hoje não, vamos tentar uma reunião, vamos chamar o Executivo para ver o que está errado, por que que o sindicato está dizendo que esse projeto não é bom, que o piso é mais, que os agentes de endemias estão perdendo. Eles não fizeram isso. Isso é uma aberração. Isso significa que os vereadores que votaram esse projeto não dão a mínima para o povo, estão lá apenas para atender aos seus próprios interesses. Para atender aquele que o Executivo está mandando eles fazerem. Então é muito grave porque é um Poder Legislativo subserviente àquele que ele deveria fiscalizar. Todos os vereadores da situação que votaram a favor daquele projeto eles são traidores sim dos servidores municipais porque tem responsabilidade igual que Rosalba teve ao enviar aquele projeto. Por isso dissemos: vocês tiram nossos direitos e nós tiramos seu sossego.

PRN – Teve algum vereador cuja postura chamou mais a atenção negativamente?

MC – Teve vereador com postura pior. O vereador Francisco Carlos, que se diz professor, ele tomou uma posição constrangedora, porque ele sabe que o que o município fez ao não cumprir o piso salarial, ele sabe que não era correto o município descontar o salário, e mesmo assim ele defendeu que a gestão estava correta. Então ele esqueceu o papel de vereador, de fiscalizar, e esqueceu de que é ser professor, já que ele se intitula professor. Alguns vereadores chamaram para si uma responsabilidade de assumir para si o papel de defender uma gestão que estava oprimindo a classe, oprimindo os servidores e eles devem ter as consequências dos seus atos. Acredito que as pessoas estão vendo isso.

PRN – O que você diria aos servidores

MC – Tudo o que nós conquistamos até hoje enquanto cidadãos isso necessitou de entrega de pessoas. Pessoas entregaram a vida para que nós tivéssemos a liberdade que ainda temos. Entregaram os copros e o seu espírito de luta sonhando que uma sociedade fosse livrem, que os direitos fossem respeitados. Sempre que a gente precisa manter esse espírito de luta, sabe que que sempre que enfrentamos uma opressão sofremos com isso, mas estamos lutando pelo que acreditamos, pela sociedade que queremos. Não lutamos só por uma coisa nossa, estamos lutando pela educação. Então valorizar professor, lutar por direitos é lutar pela defesa da educação. Acho que é isso que os professores precisam entender. E para todos os servidores e trabalhadores é que a gente precisa enfrentar. Por mais que a gente saiba que a gente sofre retaliação, pode ter formas de perseguição, mas se a gente estiver junto, a nossa força é maior que aquela força que tenta nos oprimir. Individuais somos fracos, mas todos juntos somos mais fortes que o poder que tenta nos oprimir. O que nos fortalece é a unidade. É preciso que todos os trabalhadores se assumam como oprimidos e não ficar do lado dos opressores. Eu sou daquele tempo, Márcio Alexandre, de que sempre existem dois lados. Claro que eles não precisam estar em guerra constante. Existe o lado do patrão, do opressor. Os interesses são incompatíveis. Não dá para dizer que somos amiguinhos, amiguinhas. Que estamos todos pensando no bem da educação. Estamos todos pensando no bem, mas o bem tem caminhos diferentes de seguir, de interpretar.

 

 

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