CRÔNICA

O CAMINHO DA ESCOLA

Na manhã, tarde ou noite, sucessivamente, conforme o nível do curso, o caminho era quase o mesmo. Algumas variações eram permitidas pelas muitas ruas, de três bairros existentes entre os dois pontos. Feita a opção, então o cenário era igual, casas residenciais na maior parte, pequenos estabelecimentos e algumas instituições referenciais.

Havia os hospitais. A cidade não dispunha de um serviço de pronto-atendimento. As demandas médicas da população dependiam da capacidade daqueles estabelecimentos. A Casa de Saúde Santa Luzia, então a mais recente, já era um pouco voltada ao atendimento de traumatologia. A Casa de Saúde Dix-sept Rosado era também um hospital geral, porém mais lembrada pela sua função como maternidade. O mais antigo, o Hospital de Caridade de Mossoró parecia o prédio mais imponente. Visto de fora tinha um ar solene, de tudo sob controle, como se a dor presente em suas diversas alas fosse incapaz de ultrapassar seus muros baixos, vigiados pela capela que ficava no canto esquerdo da construção. A poucos metros, na esquina da Rua Juvenal Lamartine e Prudente de Morais, o Sanatório Raphael Fernandes, de doenças infecciosas e muito associado pela população à tuberculose, que embora já tendo tratamento eficaz ainda fazia até ali muitas vítimas fatais e era temida.

Passava-se também pela Estação Ferroviária. Máquinas e vagões ruidosos em movimentos ou silenciosos aguardando a hora de partir para Porto Franco, em direção ao mar, ou em sentido contrário, no rumo do sertão. Marias-fumaças fumegantes que espalhavam fuligem por vagões que por estarem mais na linha desse incômodo eram chamados de segunda classe. Embarcamos algumas vezes nessas que o formalismo técnico chamava de composições. O destino era os arredores da Cidade de Patu, onde viviam alguns parentes distantes, se bem que naquela época, parente era parente, nenhum a maior distância que aquela alcançada por uma viagem de trem.

Quando as aulas eram noturnas, usamos muitas vezes o trajeto da Rua 6 de Janeiro. Ao percorrer seus caminhos de areia fina e branca, ouvindo o som das folhas suavemente agitadas pela brisa noturna, impressionava-nos uma casa abandonada, construção antiga com pequeno sobrado, no meio de um terreno amplo e sem muros. Suas paredes e janelas gastas pelo tempo compunham com os vários pés de cajarana, sem folhas em razão da época do ano, certo ar de mistério, no sossego daquelas horas da noite, quando a maioria das casas já dormiam.

Qualquer que fosse o itinerário, teríamos outro país, se todos os adultos de hoje pudessem recordar que um dia percorreram o caminho da escola.

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