CRÔNICA

FALANDO PARA O MUNDO

No folclore de cidades do interior do país onde havia uma rádio AM, as rádios da faixa de ondas médias, era comum a piada do locutor que dizia o prefixo e completava com a expressão “cidade tal, falando para o mundo”. A piada explicava-se pela potência dos transmissores dessas rádios, comumente limitada a 1 (um) Kilowatt. Na prática, ondas transmitidas paralelas ao solo, as transmissões em tal potência não chegavam a regiões muito distantes da cidade em que ficava a emissora, especialmente se encontravam obstáculos, como elevações naturais, no meio do caminho. Entretanto, à parte o exagero do alcance mundial que, diga-se de passagem, só havia na piada e nunca foi propagado por esses locutores, durante a noite era possível captar o som de rádios de muito longe, mesmo as de ondas médias e de pequena potência. É que, como as ondas se difundem em todas as direções, as que se dirigem ao alto são refletidas na ionosfera, uma das camadas que envolvem a terra, e projetadas muito além de onde podem chegar as que seguem horizontalmente. Esse fenômeno natural é replicado, com vantagens, na tecnologia dos satélites que hoje permitem captar sinais de rádio, aí sim, mundialmente, com qualidade excepcional, como se fossem locais. A reflexão na ionosfera não é tão eficiente durante o dia, no caso das ondas médias, mas à noite ocorrem modificações físicas que potencializam o mecanismo. Diferentemente, as ondas de menor comprimento, as chamadas ondas curtas, refletem bem melhor, mesmo durante o dia, e assim são mais competentes em transmissões de longa distância.

Era assim que antes dos satélites e da internet, ouvia-se em Mossoró, Areia Branca, Grossos, Pau dos Ferros, Angicos ou qualquer outro lugar onde tivesse um rádio comum, com faixas de frequência para ondas médias e curtas, rádios da Inglaterra, França, China, Rússia e de qualquer parte do mundo. Pelas razões explicadas a recepção era melhor à noite, mas era possível a qualquer hora do dia, com melhor ou pior qualidade, dependendo de outros fatores que interferem na propagação dos sinais. Rádios dos países acima citados tinham programações em língua portuguesa, especialmente direcionados ao Brasil, em horários diversos, o que fazia parte da comunicação global desses países, velha estratégia da geopolítica.

Os rádios atuais são produzidos para captar quase exclusivamente a faixa de frequência FM. Os chips estão em aparelhos que por meio da internet acessam todas as rádios do planeta, mas ouvir uma emissora de um país distante, a mente divagando para identificar o idioma, em um velho rádio de ondas curtas, emociona até quem já nasceu no admirável mundo novo.

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