Entrevista

Conversa da Semana com Janeayre Souto

Pressionar o Governo do Estado pelo pagamento dos salários atrasados é uma tarefa que Janeayre Souto, presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Administração Direta do Rio Grande do Norte (SINSP) tem desenvolvido diuturnamente. Seja por meio de cobrança institucional, através das redes sociais ou em declarações na imprensa quando provocada sobre o assunto. Nessa Conversa da Semana com o Portal do RN, Janeayre Souto fala abertamente sobre como avalia o governo, quais demandas não estão sendo atendidas, o que há de bom na administração e quais os principais pecados cometidos até aqui por Fátima Bezerra (PT). E apesar de pertencer ao mesmo partido da governadora, Janeayre não tem economizado nas críticas, chegando inclusive a dizer que certas decisões da gestão são “discriminatórias e preconceituosas”. Acompanhe a entrevista na íntegra:

Por Márcio Alexandre

PORTAL DO RN – Você já consegue vislumbrar algum ponto positivo na atual administração estadual?

JANEAYRE SOUTO – Sim. Tem muitos pontos positivos a atual administração. Um deles é o diálogo com o servidor, mesmo que o servidor não tenha de fato a resposta a suas reivindicações  respondida, mas que é um governo diferente. Uma gestão que respeita o servidor, mas todo governo é esse processo de disputa, um governo que para ser formado precisa da coalização política e nós servidores, servidores, através do fórum, através das entidades sindicais, cumprimos nosso papel que é reivindicar as garantias e preservar os direitos dos servidores públicos do Rio Grande do Norte.

PRN – O governo tem pouco mais de seis meses. Nesse período tem sofrido cobranças veementes feitas por você enquanto presidente do SINSP/RN, sobretudo em relação aos salários atrasados, que não foram gerados nessa gestão, embora sejam do Estado. Você acredita que já é suficiente tempo para cobranças tão fortes?

JS – É sim porque o salário nunca ficou tão atrasado. Depois, a fome não espera. A necessidade humana do servidor não pode dar um time, não pode dar um tempo, ela é contínua. Tem outra coisa: um Estado que, mesmo em crise financeira, que editou um decreto de calamidade financeira, não pode conceder reajuste de 16,38% para os procuradores, nem reajuste de 16,38% no abate-teto para os auditores fiscais e delegados de polícia, como o Governo do Estado fez. Inclusive, escolheu quais servidores seriam beneficiados, ignorando toda uma massa de servidores que tem direito a esse reajuste. Nós somos um contingente de quase 105 mil servidores, entre ativos, aposentados e pensionistas do Estado, porém o governo escolheu três categorias: procurador, auditor fiscais e delegados para conceder o reajuste de 16,38%. Outra coisa: um Estado em crise financeira não faz nomeação, uma por uma, como vem fazendo no Diário Oficial. Um Estado que está em crise, com um decreto de calamidade, ele vai no mínimo nomear o mínimo essencial e necessário para que a máquina pública funcione. E não é isso que nós estamos assistindo.

PRN – E o que o governo vem fazendo que não condiz com essa realidade?

JS – O governo que falava que iria pagar os atrasados com dinheiro novo, com a venda da antecipação dos royalties, com a venda da conta bancária, com isso e com aquilo, que nós do SISNP/RN intitulamos de futurologia, hoje nem a atual gestão acredita mais nessa futurologia, já não vai mais fazer o leilão da antecipação dos royalties – já houve inclusive comunicado oficial do Governo na imprensa – , já desconversa sobre várias coisas desse dinheiro novo. Então, o que é dinheiro novo? É necessário que o governo entenda que a dívida é da atual gestão, que nós não somos funcionários de  gestores, nós somos funcionários, do Estado do Rio Grande do Norte, que é pessoa jurídica constituída de Direito, e essa gestão tem sim um débito de 3 folhas de pagamento para com  os servidores ativos, aposentados e pensionistas. Os servidores, como toda população, são pais e mães de família.

Muitos servidores foram despejados de suas casas.

PRN –  Quais dificuldades mais graves os servidores passaram ou estão passando por conta dos atrasos de salários?

JS – Muitos servidores foram despejados de suas casas. Uma boa parte dos servidores já vendeu televisão, geladeira, fogão, mesas, cadeiras; foram obrigados a morar com familiares de favor, muitos recebem cestas básicas de doação porque não tem o que colocar na mesa para comer. Os servidores públicos não precisam passar por isso. Eles trabalharam, exerceram sua função e tem que receber seus salários. Um governo que está em crise financeira não pode se dar ao luxo de dois deputados estaduais ir negociar no Legislativo pagamento de emenda parlamentar, por mais impositiva, por mais constitucional, por mais tudo que seja, mas não pode ter nada mais impositivo que o direito do servidor de colocar comida na sua mesa, de ter direito a comprar seu remédio, deter direito a cumprir sua necessidade mínima. O governo do Estado tem que pagar, tem que resolver essa situação. Essa situação não é culpa do servidor. A atual gestão tem sim um débito de três folhas de pagamento. Esse débito tem que ser honrado, esse compromisso tem que ser pago.

Então, em 5 meses, o governo bate um recorde ao aumentar em 5 vezes a diferença salarial de quem ganha o maior salário para quem ganha o menor salário.

PRN – A senhora classificou como preconceituoso e discriminatório o projeto de lei que concebe reajuste salarial aos procuradores. Por que essa definição?

JS – Uma observação que nós fazemos é que no dia 2 de janeiro, a diferença do menor salário, que é de mil reais, para o maior, que é o de procurador, de 31 mil reais, é de trinta uma vezes. Então o governo iniciou com essa diferença, o que já é injusto porque não se concebe em nenhum canto um Estado ter uma diferença de trinta e uma vezes do menor para o maior salário. Em 6 meses de governo, hoje, 10 de julho, o atual governo do Estado consegue ampliar essa diferença de trinta e uma para 36 vezes. Então o projeto de lei encaminhado pelo governo à Assembleia Legislativa é preconceituoso e discriminatório porque eleva de 31 mil para 36 mil reais quem ganhá o maior salário, e permanece com mil reais quem iniciou com menos. Então, em 5 meses, o governo bate um recorde ao aumentar em 5 vezes a diferença salarial de quem ganha o maior salário para quem ganha o menor salário. E essa atual gestão inicia impondo uma defasagem, uma perda salarial aos servidores quando trata os servidores de forma preconceituosa e discriminatória. A categoria da governadoria (professores) teve um reajuste de 4,17%, é diferente de se dizer que teve um aumento do Piso (do Magistério), Não foi, foi um reajuste que foi concedido à categoria da governadora porque quando você pega a carreira do magistério ela é automaticamente corrigida. E agora, a do vice-governador que é procurador do Estado, e nós servidores que estamos há m9 anos sem nenhum centavo de reajuste ou reposição da inflação. Então o governo tem a obrigação tratar igual os servidores.

PRN – Mas o reajuste dos procuradores não é uma obrigação legal?

JS –  O governo mente quando diz que foi obrigado pela Constituição a conceder reajuste de 16,38% aos procuradores. É mentirosa essa informação. O que a Constituição diz é que os servidores, independente de cargo ou função, tem direito à igualitária reposição da inflação.

PRN – É possível projetar porque o governo escolheu essas 3 categorias, procuradores, auditores fiscais e delegados?

JS – Não. O governo é que tem que explicar porque.

O meu compromisso é com a categoria dos servidores públicos do nosso Estado.

PRN – A governadora Fátima Bezerra tem sua luta política originária do movimento sindical e você é uma liderança sindical,  e tem uma posição firme em relação às cobranças que faz do atual governo. Por que setores da mídia, para ficar num só exemplo, fazem uma avaliação de que você devesse ter uma postura sindical diferente da que você vem tendo?

JS – Olha, eu tenho orgulho de dizer, eu sou de Caicó, que nós construímos o PT não só em Caicó, mas na região do Seridó. Eu sou filiada ao PT desde 1984, 1985, mas eu tenho um compromisso, o meu compromisso é com a categoria dos servidores públicos do nosso Estado, com a luta dos trabalhadores e trabalhadoras do nosso Estado. O meu lado é o do trabalhador. Entendendo que mesmo que tenha ido para a rua, construir, lutar para eleger esse atual governo, nós temos que disputar esse governo e não podemos abandonar a luta dos trabalhadores, nós não podemos esquecer que o governo deve 3 folhas de salários, que está tratando os servidores do Estado de forma preconceituosa e discriminatória. O governo, quando impõe um calendário de pagamento para os meses de julho, agosto e setembro, dando um bruto de 3 mil reais, ele está impondo uma discriminação e aprofundando essa defasagem para servidores que já se encontram com salários atrasados. Preste atenção: o servidor que recebeu o salário integral de 4 mil reais no dia 15 de junho, ele só vai receber seu salário 45 dias após, só vai concluir seu pagamento em 30 de junho. Isso é um absurdo.  E esse servidor se encontra com os salários atrasados. Então, nós temos lado, nosso lado é o da luta dos trabalhadores. Nós temos uma opção. A categoria nos delegou a oportunidade de estarmos à frente presidindo o sindicato dos trabalhadores da administração direta, e eu não posso trair uma categoria de servidores, jamais trairemos nossa categoria. Nós temos lado. Nosso lado é o dos trabalhadores, o que infelizmente o governo não enxergou ainda, é que ele tem que tratar os servidores iguais. Não pode tratar os servidores do Executivo como se alguns servidores tivessem uma barriga diferente dos outros. Porque reajustar o abate-teto dos delegados e auditores em 16,38%? Porque só conceder para 16,38% para os procuradores e zero para os demais servidores? A governadora tem dado zero para os trabalhadores e nós não vamos aceitar, não vamos nos calar e 3ssa é uma disputa que nós vamos fazer. O Estado tem que dizer à sociedade porque dá zero aos servidores do Poder Executivo e a três carreiras dar 16,38%. Tem que dizer porque não paga os salários atrasados.

PRN – Governo tem mantido um diálogo com o servidor. Nesse diálogo tem havido transparência, com o governo mostrando aos servidores, por meio de seus representantes, a evolução da receita do Estado?

JS – O governo fez num primeiro momento e depois não fez mais esse repasse. Inclusive nós temos, com orientação de nossa assessoria jurídica, feitos solicitações através da lei da transparência, e vamos discutir próxima semana com nossa assessoria de tomar algumas medidas porque tem secretários do governo atual, o de planejamento por exemplo, que ousa não responder às nossas solicitações e nós vamos sim tomar todas medidas para garantir o repasse e a transparência das informações para os servidores.

PRN – Duas pautas são muito recorrentes na atuação do SINSP/RN atualmente: o pagamento dos atrasados e o reajuste salarial. Há outras demandas reprimidas?

JS – Tem sim. O respeito aos planos de carreira, a atualização da vida funcional dos servidores. Não entendemos porque o governo baixa um decreto para não conceder licenças, mas escolhe a quem está concedendo licença. Por exemplo, a secretaria de Educação é recorde disso: não concede licença, mas se eu chegar através de fulano eu consigo minha licença-prêmio. O governo atual mantém, no Poder Executivo,  somente para a Casa Civil, vale-alimentação de R$ 1.200,00 mais R$ 300 de auxílio-saúde, total de R$ 1.500,00. Então nós estamos discutindo com nossa assessoria jurídica as medidas a ser tomadas para isso. Nós somos o único sindicato nesse Estado em que temos o nosso processo administrativo em que nós solicitamos para todos os servidores o auxílio-saúde e o vale-alimentação.

O governo do Estado fechou os olhos e não está cumprindo uma decisão judicial que manda pagar os atrasados corrigidos com juros e atualização monetária

PRN – E como está a questão do pagamento dos atrasados com juros e correção?

JS – Nós ganhamos – e dizemos isso com muito orgulho pela assessoria jurídica que nós temos – já com trânsito em julgado e em processo de execução, uma ação pelo pagamento dos salários dos servidores. A ação já está valendo. O governo do Estado fechou os olhos e não está cumprindo uma decisão judicial que manda pagar os atrasados corrigidos com juros e atualização monetária, nem pagou juros nem fez a correção e nós já oficializamos o Poder Judiciário que o Governo do Estado não cumpriu, fez vistas grossas para a decisão judicial e essa ação também garantiu o que é mais importante, o direito do servidor de receber seu salário em dia. E caso o Estado não pague ate o último dia útil do mês ele terá que pagar com juros e correção monetária.

PRN – A governadora Fátima se elegeu tendo como uma das bandeiras de campanha a valorização do servidor e, pelo seu discurso, isso não vem acontecendo na prática. Há ouras demandas que também não estão sendo cumpridas?

JS – São várias demandas sim, mas eu costumo dizer que a gente vai matando matar um leão a cada vez, agora o leão que nós temos que matar é o leão para fazer com que o governo pague os atrasados, respeite os servidores com reajuste de 16,38% para todos os servidores e a garantia do pagamento dos salários em dia, e que não aceitamos, o Fórum dos Servidores disse não, a esse calendário de pagamento de julho, agosto e setembro, porque é discriminatório, preconceituoso e penaliza principalmente quem ganha o menor salário do Estado. Nós temos que discutir isso com o governo. Nós oficializamos para tratar dessas questões e infelizmente setores do governo atual fazem e insistem no diálogo do surdo-mudo.

 

 

Notícias semelhantes
Comentários
Loading...
Page Reader Press Enter to Read Page Content Out Loud Press Enter to Pause or Restart Reading Page Content Out Loud Press Enter to Stop Reading Page Content Out Loud Screen Reader Support