UM CORPO FRIO EM MEIO UM DIA DE VENDAS QUENTES

A morte do trabalhador, Sr. Moises Santos, representante de vendas de uma empresa fornecedora do Carrefour, ocorrido no último dia 14, repercutiu nas mídias, não pela violência da morte ou por está inclusa na lista da pandemia, mas pelo que ela representou dentro da rotina de trabalho e consumo da nossa sociedade.

O Sr. Moises Santos, estava em meio á sua rotina de trabalho, em uma das lojas do Carrefour em Recife (PE), quando teve um infarto e veio óbito. Após o ocorrido, seu corpo foi “coberto com guarda-sóis (tipo os usados em praia), a área em torno foi isolada com fitas zebradas, caixas de papelão e tapumes improvisados, enquanto isso todo o resto em sua volta seguiu o curso normal, ou seja, a loja seguiu com seu atendimento normal.

O corpo do Sr. Moises Santos, esfriou gradativamente, no meio do seu antigo local de trabalho, permaneceu aguardando o ML, das 7h30 até as 11h, enquanto o supermercado continuou normalmente seus atendimentos, dando seguimento a mais um dia de vendas.

Após a grande repercussão do fato nas redes sociais, a empresa assumiu ter dado um tratamento errado ao caso e afirmou que seus protocolos e orientações internas serão modificados, caso tal situação volte a ocorrer. (grifo nosso)

A lamentável situação relatada nos coloca de frente com constatações não menos tristes e deploráveis: A morte de um ser humano não basta por si só, para paralisar a rotina de vendas/produção de uma empresa; vivemos num mundo onde é necessário protocolos e orientações para direcionar o agir e o sentir humano.

Ao analisar parte da nota da empresa (grifo nosso acima), na qual essa assume o erro e justificava o tratamento dado ao caso, percebemos um mundo cada dia mais tecnológico e digital, mas, onde, o ser humano corre o risco de ser, não substituído pela máquina, mas reduzido a tal.

… “Seus protocolos e orientações serão modificados, caso tal situação volte a ocorrer”…

As leis trabalhistas e todo o ordenamento jurídico devem resguardar a dignidade do ser humano, essa deve ser dia a dia cultivada dentro de cada um.  Não somos maquinas, temos sentimentos, temos limites e histórias individuais que nos fazem únicos.

Não adiante fazermos leis, cada dia mais minuciosas, se essas forem feitas para distanciar o homem de sua essência HUMANA.

Precisamos URGENTEMENTE refazer nossos protocolos internos de humanidade, fazer prevalecer os sentimentos, acentuar a valorização e consideração pela vida, voltar a ter em primeiro plano as pessoas.  

Vivenciamos na vida real, no fato aqui narrado, algo já cantado na letra da musica de Chico Buarque – Construção- , a qual peço licença para reproduzir:

“Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego (grifo nosso)

A vida imita a arte e ainda o faz de forma mais fria, pois o Sr. Moises Santos, morreu no salão sem atrapalhar as vendas!

Por todo exposto, nessa semana, me limito a escrever sobre o fato, sem nuances jurídicas ou legais, apenas analisando como pessoa, que podia ter tido um ente querido seu, posto na mesma situação.

A humanidade não se divide em heróis e tiranos. As suas paixões, boas e más, foram-lhe dadas pela sociedade, não pela natureza. Charles Chaplin

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