Parecer do MPF dificulta privatização dos Correios
Para o Ministério Público Federal, proposta do governo Bolsonaro de quebrar o monopólio apenas dos serviços postais e aéreos fere a Constituição
O Ministério Público Federal (MPF) acolheu, de forma parcial, pedido feito pela Associação dos Profissionais dos Correios (ADCAP) para declarar inconstitucional parte da Lei 9.491/1997 que autoriza a privatização da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT) “apenas na parte em que ela executa os serviços postais e o correio aéreo nacional”.
Com esse parecer do MPF, também restou considerado inconstitucional o Decreto 10.674, de 13 de abril de 2021. Esse foi o instrumento utilizado pela Presidência da República para iniciar o processo de desestatização dos Correios.
“O MPF opinou pela inconstitucionalidade porque o que o governo quer é repassar para a iniciativa privada apenas a parte de encomendas, que é o grande filão dos Correios, a parte que dá lucro e que interessa às empresas que atuam com o comércio on line. Ocorre, porém, que nessa parte já há livre concorrência”, explica Alexsandro Gomes, da diretoria do Sindicato Empresa Brasileira de Correios, Telégrafos e Similares do Estado do Rio Grande do Norte (Sintect/RN).
Ele acrescenta que quando se abre um processo de privatização é preciso quebrar o monopólio para se vender tudo como um todo. “Mas o que acontece é que os interessados na privatização querem apenas a parte de encomendas e os Correios, por sua estrutura e toda a presença no mercado, controla os preços. O governo quer privatizar apenas para que os Correios percam o controle sobre essa parte importante e rentável”, afirma Alexsandro Gomes, ressaltando que a entrega de encomendas responde por cerca de 55% do faturamento dos Correios.
Jaedson Alves, também da diretoria do Sindect/RN, lembra que para as empresas privadas, no modelo atual, não interessa concorrer de frente com os Correios, principalmente porque é a EBCT quem pratica os menores preços na prestação desse tipo de serviço.
“O comércio on line está em expansão e quem tem interesse em controlar essa estrutura que é dos Correios são as grandes redes que trabalham com comércio eletrônico, e tem interesse porque já pegaria uma estrutura montada”, aponta Alexsandro Gomes.
Os Correios detêm o monopólio sobre os serviços de telegramas, selos, entrega de cartas, entregas de malotes. “Mas esse monopólio é uma contrapartida porque o governo é responsável pela universalização dos Correios, pela entrega conforme determina a Constituição Federal em seu artigo 21. Então para estar em todo lugar para garantir a universalização do serviço postal, a contrapartida que o governo deu foi esse monopólio”, destaca Jaedson Alves.
Ele afirma que atualmente a atuação dos Correio só é rentável em apenas 350 municípios, embora ele atue nas 5.570 cidades brasileiras. “Por meio do subsídio cruzado, devido a esse monopólio é que se torna viável a empresa atuar em todo o Brasil, e ainda gerar lucro, apesar de a EBCT não ter fins lucrativos, pois seu objetivo é garantir a universalização dos serviços postais prevista na Constituição”, relata Alves.
Com o parecer do MPF, para que o processo de privatização siga legalmente, o governo terá que aprovar no Congresso Nacional uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) quebrando o monopólio dos Correios. Ocorre, porém, que a tramitação de uma PEC demanda tempo e esforço do governo para que possa ser aprovada. “Uma PEC precisa ser votada em dois turnos em cada uma das Casas legislativas com quórum qualificado”, lembra Jaedson Alves.
“Embora o parecer do MPF dificulte a privatização nesse sentido de exigir a tramitação de uma proposta de mudança da Constituição, precisamos ficar atentos porque o Governo Bolsonaro quer que a privatização avance sem que sejam observadas e respeitadas essas questões legais”, alerta Alexsandro Gomes.
Tanto Aves quanto Gomes destacam a importância de os trabalhadores e a população em geral estarem em alerta para evitar que haja a privatização e mais ainda que ela ocorra sem respeito ao que está estabelecido na lei e na Constituição.
Eles enfatizam que a privatização dos Correios vai encarecer os serviços ofertados pela empresa, precarizar ainda mais as condições de trabalho dos funcionários da EBCT, impactar na economia dos municípios e causar a extinção de serviços que hoje somente são ofertados porque os Correios são estatizados e detém o monopólio dos serviços postais.
Os sindicalistas revelam que a luta contra a privatização dos Correios vem sendo desenvolvida em quatro frentes: por meio da Frente Parlamentar formada no Congresso contra a proposta, através dos embates jurídicos (como esse que culminou com a manifestação do MPF), através da mobilização dos trabalhadores e por meio da sensibilização da população para que perceba os graves danos que a venda dessa importante estatal causará na sociedade e na economia do país.
O parecer do MPF é datado da última terça-feira, 29/6. Veja aqui.