OPINIÃO

O caminhar da mulher nos séculos – A persistente luta pela conquista dos direitos

POR: JOANA D´ARC FERNANDES COELHO  (Segunda Ocupante da Cadeira 21 da AFLAM)


Cultura da Submissão.

Na conturbada mundialização dos acontecimentos da humanidade e, nas controvérsias dos fatos, destaca-se a secular história da mulher, que vem se edificando ao longo dos tempos, não de forma isolada, mas imbricada na dinâmica das revoluções e nas céleres transformações ocorrentes no Universo.

Os primitivos conceitos sobre a Mulher originaram mitos e lendas estereotipadas pela personificação de bruxas, feiticeiras, pecadoras e santas homogeneizando a diferenciação das contraditórias figuras de Eva, e da excelsa Virgem Maria.

Com o correr dos tempos, mesmo personificada nas figuras dos fortes ícones, outros rótulos como de mulher frágil, débil, sensível às tentações do demônio, auto conformada, obediente e dependente do poder financeiro e sexual do homem e vistas como a origem de todos os males infligidos, provocaram a introjeção de conceitos que contribuíram para a construção dos processos de identidade, tornando natural a condição da submissão e a fragilidade da mulher; e, por outra, reforçando a força, a coragem e o poder do homem anunciado socialmente. Embora todo o preconceito firmado, as mulheres eram sábias, porém desacreditadas.

A sujeição da mulher foi uma determinante do pensamento castrador provocando a revitalização de sua dependência à vida privada, o que a manteve confinada ao trabalho doméstico e à reprodução sendo dominadas, subjugadas, perseguidas e silenciadas.  Estereotipada como cidadã de segunda classe, e, em certas circunstâncias indesejadas, novos mitos e conceitos foram se fixando e a mulher passou a ficar à margem da sociedade, sem poder usufruir o direito a ter direitos, consagrando e internalizando assim, a cultura da submissão.

Na antiguidade, às mulheres eram concedidos os direitos de acordo com as próprias visões de mundo, permitindo que se firmasse, nas sociedades, a construção da cultura da submissão, caracterizada pelas diferenças ideologicamente fixadas, proporcionando a legitimidade dos abusos sofridos pelas mulheres ao longo dos tempos.

A diversidade histórico-cultural é uma das causas essenciais da discriminação feminina, fator que induz e fortalece a dominação dos homens que acaba estabelecendo o absoluto poder sobre a mulher, e tudo isso fere o princípio da dignidade da pessoa humana que é conferido pelo livre gozo dos direitos fundamentais.

A luta das Revolucionárias.

Mesmo forçada a ser submissa, a mulher não se conteve, não se calou, e encetou uma luta no contexto histórico-cultural, em busca da conquista pelos direitos básicos, enfrentando os obstáculos e preconceitos impostos pela sociedade. No conturbado final do Século XVIII e século XIX, existiram mulheres corajosas, com pensamentos revolucionários e avançados, que se rebelaram com a sua condição social, como foi o caso da francesa Marie Olympe de Gouges, dramaturga, ativista política, feminista, abolicionista e defensora da mulher em igualdade de direitos com os homens e, criou a “Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã”, sendo guilhotinada pelas suas posições ideológicas, o pensamento de Mary Wallstonecraft, filósofa inglesa e defensora dos direitos da mulher  que se insurge contra os limites da discriminação intergênero. No Brasil, cinquenta anos mais tarde, (sec. XIX), surge Nísia Floresta Brasileira Augusta, brasileira, norte-rio-grandense, que mostra a privação dos direitos e a injustiça cometida pelos homens. Outra contemporânea, Flora Tristan  se soma  à luta contra a discriminação.

Nos últimos 150 anos, o movimento feminista emerge, passando a ser um fato irreversível, multifacetado, provocando diversas mudanças sociais, valendo sacrifícios e abnegação, em que muitas foram protagonistas de atos heroicos, das tragédias e glórias, como verdadeiras heroínas e mártires dos seus ideais, ressaltando-se, a coragem das 130 operárias que se organizaram fazendo greve, para obter melhores condições de trabalho, e igualdades de direitos trabalhistas, mas, terminaram carbonizadas num incêndio de uma fábrica têxtil de Nova York.

Agentes de Transformação.

Na constância das lutas pelas conquistas dos seus espaços, a mulher do Século XX, passa a ser responsável pela revolução das mentalidades e pela construção de novos paradigmas, saindo da passividade, e a partir de uma visão mais crítica, passa a ter consciência de seus direitos como cidadã, como trabalhadora, companheira, mãe, podendo questionar, opinar, provocar mudanças. A mulher cria o caminho das transformações, e  reelabora a imagem do passado deixando de ser  objeto da submissão e da obediência, para  ser sujeito de sua própria história, enfrentando com coragem e ousadia os desafios impostos pelas desigualdades de gênero, pela discriminação no mundo do trabalho, e cria mecanismos para sua própria sobrevivência, alicerçados pelo alvará da sua independência econômica. E, como agente transformador de sua própria realidade, desafia os obstáculos e os preconceitos socioculturais, e, luta pela fixação da consciência intencional, que possibilita a conquista do direito da emancipação individual, social e política.

A história é sequencial. Continua acontecendo em todos os recônditos do mundo, inclusive no universo privado. Situando as muitas Evas, Marias e Madalenas, do universo privado, sem porte de brasões, sem tradição familiar, mesmo no anonimato, fizeram uma inflexão na direção da secular cultura da submissão com propostas de ações feministas e revolucionárias nas figuras das: rezadeiras, milagreiras, carnavalescas, lideres comunitárias, contadoras de história, doceiras, mãe de santo, parteiras leigas, entre tantas outras mestras da cultura popular, cheias de sabedorias, vozes dos saberes oralizados, que foram apagadas pela evolução do progresso.

Somadas à história dessas feitoras da cultura popular, outros fatos aconteceram e vêm acontecendo, como é o caso do primeiro voto feminino, marco na história da mulher riograndense e brasileira, a lei Maria da Penha, instrumento legal que busca inibir a violência doméstica e sexual, classificada como o crime de gênero, a ocupação de cargos de governança política, com o direito de votar e serem eleitas para assumirem funções no executivo e legislativo, mulheres cientistas das ciências tecnológicas, da medicina, da  informática, da robótica, entre outras ocupações, até então, destinadas aos homens.

Mesmo com as diferenças de gênero, que ainda perdura nesse mundo hodierno, as mulheres devem ter a consciência de que a aura do sagrado feminino, a eleva para a condição de um viver mais digno, eliminando a ideia das submissas Evas, Marias e Madalenas.

Nas turbulências da vida, a mulher continua a insistir pela garantia da igualdade, pela legitimidade dos direitos e que sejam estabelecidas novas relações de gênero. Mas, mesmo assim, muitos problemas ainda existem para serem enfrentados e corrigidos como e o caso da violência, do feminicídio, do aborto, da ditadura da beleza, e da própria diferença salarial.

Embora todos os confrontos enfrentados historicamente, pelas Evas, Marias e Madalenas, acreditamos ser uma criação divina. Somos a outra metade da vida, somos um brinde da natureza, musa inspiradora de canções, poesias, de pinturas em telas, somos sensuais, atraentes, somos cíclicas como a lua, somos as viajantes do tempo, somos a remetente e a destinatária, somos idealizadoras, sonhadoras, propagadoras vivendo num mundo cheio de regras. Enfim, admitindo o que cita a Bíblia, a mulher é uma obra prima criada por Deus.

As mulheres e a sua saga, dos primórdios aos dias atuais.


 Joana D´Arc Fernandes Coelho (Cadeira 21 da AFLAM) Professora Titular Aposentada da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. É Pesquisadora, Palestrante e Escritora. É Assistente Social e Mestra em Desenvolvimento e Meio Ambiente. É Membro das Entidades Afins Culturais: Instituto Cultural do Oeste Potiguar – ICOP, da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço – SBEC, da Associação de Escritores Mossoroenses – ASCRIM, do Conselho Internacional dos Acadêmicos das Ciências, Letras e Artes – CONINTER, da Associação Lítero Artística das Mulheres Potiguares – ALAMP, da Academia Feminina de Letras e Artes Mossoroense – AFLAM e da Academia de Ciências Jurídicas e Sociais de Mossoró – ACJUS. É Sócia Correspondente da Academia Apodiense de Letras – AAPL, da Academia de Letras e Artes de Martins – ALAM e da União Brasileira de Escritores UBE –RJ, além de Amiga do Museu do Sertão e Presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais-CMPC.

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