CRÔNICA

AS MÃES PARTEIRAS

Elas estavam disponíveis a qualquer hora. Todo mundo sabia onde moravam as parteiras e era para lá corriam sempre que “chegava a hora” da mulher, fosse essa hora durante o dia ou durante a noite, pingo do meio-dia ou madrugada chuvosa. Elas não se faziam esperar. Colocavam a peça de roupa mais à mão e acorriam para a casa da parturiente. Tratava-se assim de um plantão permanente, 24 horas por dia, a vida toda dessas mulheres que tinham por ofício e vocação ajudar outras mulheres. As irmãs Noemi e Júlia Borges, na região mais central, Dona Chiquinha, nos Paredões, Maria Correia, nas Barrocas, são alguns nomes que viram nascer praticamente toda cidade mossoroense de sua época, mas no Alto de São Manoel, Alto da Conceição, Doze anos, Boa Vista, Santo Antonio e Bom Jardim, assim como nas comunidades rurais, outras são lembradas, sempre associadas ao sentimento de gratidão. O Hospital da Mulher, em Mossoró, homenageia a parteira das Barrocas.

A cidade tinha um único hospital especializado, a Maternidade Almeida Castro, e médicos generalistas, alguns poucos com experiência e prática relacionadas a esse tipo de atendimento, mas o comum era o parto em casa. A parteira era autoridade máxima nessas circunstâncias e a confiança da família naquela especificamente era fundamental. Água fervente para “esterilizar” as ferramentas e materiais para laquear e cortar o cordão umbilical do recém-chegado. Clima de expectativa para saber se era menino ou menina, pois na época não havia como saber antes de a mulher “descansar”. Era comum a crença em que crianças “pegadas” por tal parteira eram mais saudáveis e tinham mais probabilidade de sobreviver do que as assistidas por outra. A verdade é que a realidade de então, com limitações de recursos e de assistência pré-natal e perinatal, constituía por si só um risco e o ato fisiológico do nascimento, sob algumas circunstâncias, um desafio para mãe e bebê. É possível que situações difíceis tenham sido contornadas por parteiras experientes, mas a ausência de registros formais do que se passava dentro dos quartos das residências pode ter negado a elas esse crédito.

Ao ingressar no mundo já se tinha uma outra mãe, além da biológica. Isso porque era cultural o hábito de chamar a parteira de mãe. Algumas faziam questão de assim serem tratadas pelos “filhos”, inclusive com a tomada da bênção. A mãe de fato e o pai viravam “comadre” e “compadre” da parteira e este era um laço destinado a durar enquanto essas pessoas caminhassem pela terra. Era primeiro vínculo humano daquele ou daquela que vinha à luz.

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