O transbordamento das águas do leito natural do rio, à altura da área urbana de Mossoró, era um transtorno afetando principalmente o centro e os bairros Pereiros, Paredões e Barrocas que tinham casas e estabelecimentos comerciais invadidos pela enxurrada. A Pça. Rodolpho Fernandes e o atual local da Cobal pareciam grandes lagos. Por outro lado, era impressionante como essas enchentes viravam uma festa na cidade. Não era só a meninada, que se esbaldava e se divertia tomando banho de rio no terreiro de casa ou onde antes era um campo de pelada. Adultos iam para as balaustradas situadas próximo às pontes para ver a água cobrindo a parede naquelas pequenas barragens. Faziam fotografias, tanto que muitas delas circulam até hoje por aí. E não havia câmaras de celular para sair “tirando retrato” de qualquer coisa. Kodak ou Rolleilex eram objetos raros e era complicado fotografar e mandar revelar os filmes de 12, 18 ou 24 posições, torcendo para não perder algum, o que causava decepção e saia caro.
Fotógrafos profissionais faziam, sem que fosse para jornal (o que seria natural), fotos de águas correndo pelas ruas, praças e avenidas, medindo a altura da lâmina na parede dos prédios, flagrando principalmente homens, calças arregaçadas até os joelhos, passeando alegremente nesse cenário.
A maior preocupação era com os danos causados diretamente pela inundação em relação a bens materiais, começando pelos próprios prédios e residências, estendendo-se a móveis, estoques de mercadorias e, na zona rural, lavouras ribeirinhas. Também preocupavam os acidentes por afogamento, principalmente entre crianças e entre aqueles que, comemorando o que quer que fosse, abusavam do consumo de outro tipo de água, aquela que passarinho não bebia, mas, do jeito que as coisas mudaram, não duvido que agora beba. Praticamente não se falavam nos riscos de doenças, especialmente leptospirose ou a disseminação de parasitoses comuns facilitada pela contaminação dessas águas.
A dicotomização do rio, por ação da Prefeitura, livrou a cidade desse vexame periódico, triste para uns e emocionantes para outros, mudando a geografia da cidade. Entretanto, alguns anos sem chuvas ou sem chuvas torrenciais fizeram com que pessoas, possivelmente neófitas na cidade, desconhecendo determinadas características da topografia local e à revelia do controle do público, construíssem em áreas de drenagem superficial natural de águas de chuva, fato que, aliado à crescente impermeabilização de ruas, com galerias obstruídas (onde existem), criaram outras formas de alagamento, independentes das tradicionais cheias do Rio Mossoró.