Artigo

Professores explicam como isolamento social salvou vidas

Sem medidas de restrição, de 28 de fevereiro até hoje, RN poderia ter registrado aproximadamente 1.500 óbitos

Virus homini lúpus: avanço no número de mortes pelo Covid-19 no RN e no Brasil

 

* João Maria Soares

**André Victor Cavalcanti Seal da Cunha

 

A máxima do dramaturgo romano Plautus (254-184 a.C.), “homo homini lupus” foi notabilizada por Thomas Hobbes (1588-1679), na sua famosa obra Leviatã. Ela remete a uma importante advertência para a humanidade: o homem é o lobo do homem. Ou seja, os seres humanos, muitas vezes representam uma ameaça para a sobrevivência dos indivíduos de sua própria espécie. Temos assim uma capacidade destrutiva e autodestrutiva incomensurável em diversas ocasiões. No momento que vivemos, um vírus é o animal a ser enfrentado.

A pandemia provocada pela Covid-19 já ultrapassou mais 3,5 milhões de casos e já causaram aproximadamente 250 mil mortes no nosso planeta. Os primeiros casos surgiram na cidade de Wuhan na China, espalhando-se pela Europa e chegando às Américas. Hoje os Estados Unidos é o epicentro do Covid-19 no mundo com mais 1,1 milhão de casos e 68 mil mortes, dados oficiais. No Brasil, segundo dados oficiais do Ministério da Saúde – MS, o primeiro óbito aconteceu no dia 17/03 e, após 46 dias o país superou a marca de 6,7 mil óbitos. De que forma se deu esse crescimento? O podemos prevê daqui para frente?

Para tentar responder essas perguntas, levaremos em consideração os números oficiais de óbitos ao longo deste tempo. Ao invés, do número de casos notificados oficialmente pelo MS, devido à subnotificação, uma vez que poucos testes foram aplicados no país.

A Figura 01 mostra um gráfico da evolução do número de óbitos registrados em função da quantidade de dias. As previsões iniciais do número de óbitos no Brasil eram mais assustadoras do que temos hoje. Caso fosse mantida a tendência inicial, linha amarela da Figura 01, poderíamos ter tido quase 30 mil óbitos hoje no país. No entanto, como podemos observar a partir do dia 09/04, quando tínhamos 941 óbitos no Brasil, há uma mudança na curvatura deste gráfico e mantém-se até 03/05.

Com base em previsões já feitas para outros países, fizemos um ajuste exponencial para esses dados. A linha verde da Figura 01 mostra o resultado desse ajuste. Caso esse comportamento mantenha-se por mais 10 dias (13/05), podemos estimar um número de óbitos em torno de 15.000 e aproximadamente 1.200 mortes diárias. O pior pode acontecer se essa tendência se mantiver por mais 10 dias (23/05), poderemos dobrar o número de óbitos, chegando a 30.000.

A Figura 01 também mostra o número de óbitos no Rio Grande do Norte – RN. A primeira morte aconteceu no aconteceu dia 28/03. A linha vermelha é uma projeção feita caso fosse mantido o crescimento exponencial inicial, ou seja, no dia 02/05 poderíamos ter tido aproximadamente 1.500 óbitos no RN. Entretanto, no dia 19/03 o governo do RN baixou um decreto instituindo o isolamento social horizontal. O resultado deste decreto pode ser observado na mudança da tendência de crescimento no número de mortes, a partir do dia 09/04, quando tínhamos 17 óbitos. Assim, o isolamento social pode ter salvado pelo menos umas 1.400 vidas.

Agora faremos uma nova análise que leva em conta o número de óbitos registrados no período de 09/04 a 30/04, destacada com linha azul no gráfico da Figura 01. Neste novo cenário, estimamos que no dia 13/05 poderemos ter em torno de 130-140 óbitos e 10 mortes diárias. Mantendo-se as projeções atuais por mais 10 dias (23/05), poderemos chegar aproximadamente a 300 óbitos no final deste período.

Figura 01 – Evolução do número de óbitos no Brasil e no Rio Grande do Norte causados pela Covid-19.

 

Esse breve estudo mostra dados preocupantes com a evolução de número de Covid-19 no Brasil e acende um alerta para os nossos governantes. Os dados mostram que ainda não chegamos ao topo do número de casos e, por conseguinte, no número máximo de óbitos para esta pandemia.

As medidas recomendadas pela Organização Mundial da Saúde, adotadas pelos governos estaduais e municipais, como o isolamento social, foram muito importantes para diminuirmos o crescimento exponencial inicial do número de mortes. Isso pode ter salvado a vida de pelo menos 20.000 pessoas como detalhamos anteriormente.

No entanto, ainda é cedo para relaxarmos com o isolamento social da população, uma vez que ainda temos uma tendência de crescimento no número de casos no país. Tudo indica que a adoção precipitada do relaxamento social, como está sendo feito em algumas cidades brasileiras, poderá resultar em uma nova mudança na taxa de crescimento no número de casos. O resultado disso pode ser o colapso do sistema de saúde no país, ainda na fase aguda dos casos de Covid-19. Portanto, corremos o risco de termos prorrogado o problema da pandemia, produzindo um cenário ainda pior para a população do Brasil, em relação ao que estimamos.

Assim, as escolhas que faremos agora serão determinantes. Enfrentaremos juntos o vírus, mantendo o sacrifício do isolamento? Vale aqui à importante advertência de Plautus. Se precipitadamente sairmos ou afrouxarmos a quarentena, o homem será o lobo do homem. Não o vírus. Ele é apenas um organismo acelular. Está fazendo o seu papel na dinâmica da vida. Não tem escolha. Nós temos. A escolha é toda nossa.

* Professor do Departamento de Física / FANAT-UERN

** Professor do Departamento de História / FAFIC-UERN

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