Veículos

Montadoras perdem 80% das vendas e esperam que governo destrave crédito

Maior parte do lote já enviado aos Estados é de testes rápidos, com 'limitações importantes' na eficácia; medida é um pilar do projeto para revisão do isolamento social

Uma semana antes do paradão, em meados de março, no Brasil se compravam cerca de 11 mil veículos por dia. A média de abril, até dia 20, era de 2.250 veículos por dia, baixa de uns 80%. A queda em relação a abril do ano passado também anda pela casa dos 80%.

Já foi pior. Na semana final de março, os licenciamentos não passavam de 1.300 por dia.

Quase nenhuma montadora prevê reiniciar a produção de veículos antes de maio. A retomada da atividade deve ser postergada e lenta mesmo nessas mais otimistas. Várias devem voltar pouco antes do início de junho.

Sobram estoques, não se sabe o futuro da epidemia em cada região onde estão as fábricas (mais de 40% da produção é na Grande São Paulo) nem as diretrizes dos governos para o comércio, por exemplo.

Por ora, as empresas adaptam as fábricas ao mundo da epidemia. As linhas de produção ficarão mais lentas, por falta de demanda e porque precisarão ser ajustadas para evitar contaminações. Serão necessários mais ônibus para transportar trabalhadores (para evitar lotação). Será preciso repensar refeitórios que chegam a servir milhares de refeições por dia, comprar máscaras e instalar medidores de temperatura (para detectar febris), conta Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea, a associação das montadoras.

No mais, a preocupação central da indústria é com o crédito: financiar capital de giro e prolongar o prazo de pagamento de empréstimos já contraídos. O caixa míngua, como no país quase inteiro. Além do mais, é preciso fazer com que o socorro chegue a toda cadeia, de fornecedores a concessionárias, afirma Moraes.

O problema com o crédito vai além. Aumentou o custo de captação dos bancos das montadoras, instituições que financiavam 45% dos veículos vendidos antes da epidemia _isto é, o crédito pode ficar mais caro.

Dinheiro há, o Banco Central aumentou a liquidez. Mas os bancos estão na retranca porque a perspectiva de inadimplência é enorme, em geral. Faltam, pois garantias. De algum modo, isso pode vir do governo, que assumiria parte do risco.

Segundo Moraes, há conversas avançadas entre ministério da Economia, BNDES, bancos privados e montadoras, caso a caso, e com a Anfavea. As empresas precisam da solução “para ontem”; Moraes acredita em algum acordo até o final desta semana. As suspensões de contrato, reduções de salário e outras medidas do gênero já começaram.

As montadoras de veículos e máquinas agrícolas empregam diretamente 123 mil trabalhadores em 10 estados e 40 cidades. Têm peso de 10% na indústria, atrás apenas da indústria de alimentos e do setor de petróleo e combustíveis, mas são o ramo que, para cima ou para baixo, arrasta consigo a cadeia produtiva mais longa e extensa. No geral, a indústria de transformação como um todo “puxa” mais o PIB do que qualquer outro setor da economia.

O governo ainda anda devagar no planejamento das medidas contra a ruína. Ainda não tem medidas para microempresas, para empresas que faturam mais de R$ 10 milhões e para grandes empresas especialmente abaladas pelo paradão.

Decerto não se pode fazer favor para graúdos bem de vida. Mas a desgraça é geral, em micro, pequenas, médias e grandes. A redução do consumo do desempregado da grande ou da pequena afeta a economia da mesma maneira.

A destruição de empresas e poupanças tornará a retomada ainda mais difícil. Acreditar que, num distante “depois da crise”, basta voltar a “reformas e ajuste fiscal” é mistura de loucura e incompetência.​

Jornal Folha de S. Paulo

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