CRÔNICA

LUZES QUE SE APAGAM

Quem terá tomado a última gota do Café Vitória? As atividades da torrefação foram encerradas. A marca não foi atualizada e desapareceu. O último pacote produzido foi consumido em alguma casa mossoroense. Alguém sorveu, talvez dando uma olhada para a última porção no fundo da xícara, antes de vira-la junto à boca com ligeira flexão posterior do pescoço para aproveitar o máximo. Se é impossível saber quem foi, é fácil saber que o fez com prazer, pois o Café Vitória era “Bom até a última gota”.

Do mesmo modo não vamos saber quem foi o último ou última cliente a entrar nas “Lojas Paulista” antes que elas baixassem as portas, definitivamente, no seu endereço da Praça Rodolpho Fernandes. Uma tarde qualquer a frente da loja reunia um agitado ajuntamento de pessoas. Em um plano mais elevado Jorge Ivan Cascudo Rodrigues anunciava os cortes de tecido a serem arrematados no “Leilão Maluco”. Levava quem fizesse a menor oferta. A condição obrigatória era ter o valor exato no bolso para pagar. O pagamento era em espécie e não se recebia valor que necessitasse troco. Muito menos se aceitaria, fosse hoje, o agora clássico “faça um pix”. A loja de tecidos fundada pela família Lundgren, pernambucana de origem sueca, virou Casas Pernambucanas (aliás, já tinha esse nome nos Estados do Sudeste) e se expandiria para todo o país como a maior rede de venda de eletrodomésticos. Depois regrediu e sumiu.

Também a Casa Santo Antonio, A Magestosa e a Sapataria São Francisco tiveram seus últimos clientes que certamente usaram o último par de sapatos comprados nesses estabelecimentos até muito tempo após eles terem existido. As marcas de calçados primavam não sé pela beleza e elegância dos modelos, mas também pela qualidade e, consequentemente, durabilidade.

A Farmácia Assunção, Farmácia Rosado, Farmácia Medeiros, Farmácia dos Pobres, Drogaria Rio Grande ou a mais recente Drogaria Xaxá também atenderam a uma última venda. Terá sido um simples analgésico? Teria aliviado a dor de quem tomou?

Em que circunstâncias cada um desses negócios viveu seu último dia? Que sentimento se passou pela mente de proprietários, funcionários ou mesmo de clientes e pessoas que passavam, vez em quando, para simplesmente conversar à porta de um ou de outro. Outros estabelecimentos surgiram. Outros virão no lugar dos atuais. Outras formas de envolvimento emocional com os compradores, serão criadas. Assim foi e será. Que o sapato “dure até se acabar” e o café seja bom até a última gota.

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