A deputada federal Natália Bonavides, do Partido dos Trabalhadores (PT/RN) foi a única representante do Rio Grande do Norte na Câmara Federal a votar contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 186) que congelou os salários dos servidores públicos e trará uma série de problemas para a população. Nessa entrevista, ela fala sobre os desdobramentos da PEC, comenta sobre o enfrentamento aos absurdos do atual governo federal e aponta sobre o que é preciso para que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) seja responsabilizado pelo caos que se abateu sobre o país, sobretudo em relação o descontrole da pandemia da Covid. Veja na íntegra:
Por Márcio Alexandre
PORTAL DO RN – A PEC 186 já foi promulgada pelo Congresso. O que ela trará de consequências para o serviço público de forma imediata?
NATÁLIA BONAVIDES – A PEC vai impedir a realização de novos investimentos públicos. Na prática isso quer dizer que não haverá recursos para novos hospitais, por exemplo. Em plena pandemia, aprovar algo desse tipo é demonstrar o total e absoluto descaso com a vida das pessoas. Ela também impede que sejam feitos novos concursos públicos e que sejam concedidos reajustes salariais aos servidores. E vai além, proibindo reajustes também do salário mínimo, afetando não só os servidores públicos.
É o serviço público que tem sido fundamental no enfrentamento da pandemia, principalmente por meio da atuação do SUS.
PRN – Congelamento de salários dos servidores públicos no contexto de inflação que temos não significa, a médio e longo prazo, inviabilizar o serviço público?
NB – Significa inviabilizar e piorar muito a qualidade dos serviços, pois são exatamente as servidoras e servidores públicos que estão atuando na linha de frente no combate à pandemia, alguns dos principais afetados. O que demonstra ainda mais o tamanho do absurdo, pois é o serviço público que tem sido fundamental no enfrentamento da pandemia, principalmente por meio da atuação do SUS. E não é só o pessoal da saúde que está nessa situação. Podemos destacar, também, os trabalhadores da segurança pública, que sentiram muito a granada que foi colocada no bolso por Paulo Guedes e Bolsonaro.
PRN – Não se vislumbra nenhuma chance de se minimizar os efeitos dessa PEC, por via legislativa ou judicial?
NB – Há algumas possibilidades sim. Terça, 16 de março, o PT e a REDE apresentaram uma ação direta de inconstitucionalidade no STF para questionar parte da PEC da Fome. O que aconteceu é que conseguimos aprovar, por meio de um destaque (que é a votação de um trecho da PEC separado), a continuidade da vinculação dos recursos dos fundos públicos. Depois disso, a Mesa Diretora, em total desrespeito ao que foi aprovado, mudou o texto para atender o desejo do governo e permitir que parte dos recursos dos fundos, que devem ser usados em políticas públicas, sejam usados para o pagamento da dívida pública. Mas é importante ter em mente que somente a luta institucional não irá nos tirar dessa situação difícil. É preciso muita organização, luta e mobilização popular e muita pressão para que possamos derrotar o bolsonarismo e sua política genocida.
PRN – O retorno do auxílio emergencial foi condicionado pelo governo à aprovação dessa proposta. Mesmo com essa chantagem, a oposição, especialmente o PT, votou contra. Não foi uma atitude arriscada demais do ponto de vista da opinião pública?
NB – De forma alguma. Defendemos o retorno do auxílio emergencial, contra o que apresentou o governo e a direita no parlamento. A proposta do auxílio é, desde o começo, do PT e das forças de esquerda. Se dependesse da direita o auxílio não teria existido. Acontece que o governo Bolsonaro, de forma covarde e cruel, acabou com o auxílio no final de 2020 para chantagear agora, condicionando o seu “retorno” à aprovação de um pacote de austeridade inaceitável. Se o governo quisesse restabelecer o auxílio emergencial já teria feito isso, nem precisava esperar pelo Congresso e não teria deixado o povo ficar desde dezembro sem receber qualquer tipo de auxílio. Sabe o que a PEC trouxe em relação ao auxílio? Um limite de gastos que deixará milhões de pessoas que precisam sem nenhuma assistência e um valor de R$ 150,00, que é absolutamente insuficiente para a maioria dos poucos que receberão.
PRN – A Procuradoria Geral da República (PGR) aceitou pedido de investigação contra o ex-ministro Eduardo Pazuello por aquele episódio do Plano de Vacinação. A saída do general da pasta pode comprometer uma possível responsabilização dele pelo caos em que se transformou o enfrentamento à pandemia no Brasil?
NB – Não. O que acontece é que ele deixa de ter foro por prerrogativa de função. O que isso significa, na prática? Basicamente que ele não será mais julgado no STF. A investigação segue sendo feita pelo MPF e uma possível ação será julgada na primeira instância da Justiça Federal.
Precisamos de muita mobilização e pressão popular para conseguir a responsabilização do presidente.
PRN – Ao afirmar que “a política de enfrentamento à pandemia é do governo federal e não do ministério da Saúde”, o novo ministro deixa claro que teremos mais do mesmo. Será possível se buscar a responsabilização do presidente?
NB – Como falei, precisamos de muita mobilização e pressão popular para conseguir a responsabilização do presidente. Ele tem uma blindagem no Congresso que garante que continue cometendo suas atrocidades. Uma blindagem que não é de hoje. Já foram apresentados 74 pedidos de impeachment à Câmara. Nenhum deles teve seguimento pela cumplicidade tanto do ex quanto do atual presidente da Câmara.
PRN – Uma das ações da Câmara Federal mais esperadas por grande parte da população foi a CPI das Fake News. Como está a situação dos trabalhos desta comissão?
NB – Os trabalhadores continuam suspensos.
Bolsonaro, agindo como aliado do vírus, mescla o negacionismo com o neoliberalismo.
PRN – Desemprego elevado, alta inflação, pandemia sem controle, ataques a direitos da sociedade. O que tem sido mais difícil de combater nesse atual governo?
NB – O combate necessário é contra o conjunto dessas medidas. Bolsonaro, agindo como aliado do vírus, mescla o negacionismo com o neoliberalismo. De tal forma que não há como apontar um ou outro aspecto pior de suas políticas, pois elas estão intimamente conectadas no sentido de promover o maior desastre possível. É por isso que o conjunto da política e do governo precisa ser enfrentada e derrotada.
PRN – Será possível vencermos esse atual estado de coisas que se abateu no país desde janeiro de 2019?
NB– Precisamos vencer. E a classe trabalhadora brasileira tem todas as condições de fazer isso. Agora, com Lula tendo recuperado seus direitos políticos, precisamos avançar com uma estratégia que tenha como centro a luta política e social em 2021, em defesa da vida, da vacinação e do emprego.