Crônica

DIO, COME TI AMO!

No cinema dos efervescentes anos 1960, enredos que refletiam sobre os dramas existenciais, os choques entre o sonho e o real, as discussões políticas e sociais, as tramas investigativas, isso tudo era o que dava prestígio ao filme e satisfazia plateias intelectualmente exigentes quanto a aspectos de conteúdo, estética etc. Tempos de Fellini, Godard, Antonioni, Woody Allen e ainda de Hitchcock e sua fama de mestre do suspense. Tempo, no Brasil, do chamado cinema novo, influenciado pela nouvelle vague.

Enquanto isso, ignorando narizes torcidos, outra categoria de filmes lota as salas de cinema, particularmente no Brasil. São os musicais agitados de Elvis Presley e Doris Day ou plenos de sentimentalismo do pequeno Joselito; e as histórias açucaradas, com ingredientes musicais, de, por exemplo, Candelabro Italiano (Rome Adventure) e Artimanhas de Amor (Tammy and the Doctor). Neste último, a atriz Sandra Dee dá de bônus seu talento de cantora. Em alguns casos, o número de expectadores se supera e o que era lotação vira superlotação. Isso ocorreu com o filme Dio, Come Ti Amo!

Não vamos discutir a qualidade do roteiro, uma moderna história de Cinderela, em que Gigliola Di (Gigliola Cinquetti), uma moça italiana de família pobre, e Luis (Mark Damon), um rapaz espanhol rico, se apaixonam. Tudo se inicia quando a italiana salva a vida de uma nadadora espanhola, em caso de acidente, e grande amizade surge entre as duas. Entre idas e vindas, em uma festa na Itália, um mal-entendido faz com que o espanhol decida apressadamente uma volta para casa abandonando a namoradinha italiana.

Em Mossoró o filme passou dezenas de vezes. Sempre no Pax. A cena final é um clássico do gênero. A mocinha entra naquele carro com um casal amigo e inicia a corrida para o aeroporto, começando a tensão da torcida para que chegue a tempo de impedir a partida do namorado. Quando o piloto liga os motores, ela invade a sala de controle e pede para mandar um recado para o avião. Surpreendentemente, em vez daquele som mascado e chiado das vozes que saem daqueles rádios de comunicação, no interior da aeronave ouve-se nitidamente o suave canto da personagem na canção-título do filme. Quando o avião começava a taxiar até aquelas pessoas que tinham assistido ao filme outras vezes (e não eram poucas) duvidavam se haveria tempo de salvar a lavoura. Mas na hora que o avião parava, a porta se abria e os dois corriam um para o outro em pista aberta, as lágrimas corriam nos olhos dos personagens e de muitos expectadores. Aí, só havia tempo de disfarçar, antes de as luzes do cinema acenderem, as portas se abrirem e uma plateia aliviada dispersar-se na noite, na frente do Pax.

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