CRÔNICA

CARNAUBA, UM SÍMBOLO

“Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia na fronde da carnaúba.” Na abertura do primeiro capítulo de “Iracema” José de Alencar deixa a cada um o arremate, o acabamento, o arranjo final na construção dessa bela imagem nordestina em que a carnaubeira é uma das protagonistas em sua esguia e elegante majestade. É possível imaginar esse cenário pela manhã, a mata brilhando aos raios de um sol criador, ainda a recender o perfume trazido da madrugada, os leques verdes da carnaubeira concertando como verde do mar, como descreve o bardo cearense. Pode-se igualmente conceber na imaginação a sua copa dançando ao Vento Nordeste, ao Vento Aracati, no meio de uma tarde do sertão. Ela, a carnaúba, negando-se a abrir mão de sua esmeralda a despeito de a caatinga já ter trocado esse luxo estético pela chance de sobrevivência até que a próxima estação de chuvas lhe restitua o esplendor.

A carnaúba é hoje quase apenas uma lembrança em nossa zona rural e uma raridade na cidade, onde elas antes eram referência em vários locais, em frente de residências ou nos seus quintais, em praças e em alguns terrenos, solitárias ou em pequenos grupos, nascidas e crescidas por vontade própria da natureza ou plantadas por alguém que já não sabe mais quem foi.

É nossa palmeira por excelência. Seu fruto de gosto sui generis é penalizado por concorrer, aqui, com uma das maiores variedades de frutos do planeta, cada um mais saboroso que o outro. Mas quanto significou essa que no meio acadêmico atende pelo austero nome de Copernicia prunifera, fornecendo com seu caule estruturas de construções seculares, com suas folhas a base de rico artesanato regional, com seu pó e cera, matéria prima para inúmeros produtos industriais, da indústria fonográfica à de medicamentos, tudo isso e muita coisa mais, como se não bastasse a sua citada beleza de poema físico em meio à rusticidade do semiárido.

A árvore não está apenas na literatura do cearense Alencar. O Estado, assim como o Piauí a tomam como símbolo. O Rio Grande do Norte tem a cidade de Carnaubais, que significa mata formada de plantas dessa espécie. Mossoró tem um bairro com o mesmo nome. O Prefeito mossoroense Dix-huit Rosado imaginou a carnaúba embelezando a cidade, manifestação do espírito telúrico do velho alcaide, e plantou-a por diversas ruas a ponto de uma delas, a Rua Mal. Floriano, nos paredões, ser hoje mais conhecida pela sua presença do que pelo nome de direito da via.

Movimentadas pela brisa noturna, as folhas dos carnaubais sussurram sons que falam ao espírito, e evocam noites como elas foram antes.

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