CRÔNICA

A HORA E A VEZ DE SARUÊ

Foto: https://historiadofutebol.com/blog/?p=123400

“Saruê pendurou as chuteiras e ficou pobre e só…”. A frase é de uma crônica do Professor Raimundo Nonato da Silva e está no livro “Futebol de Mossoró. Pequenas grandes histórias”, de Lupércio Luiz de Azevedo. Cresci ouvindo falar de seus feitos no futebol mossoroense. O cronista o descreve como jogador objetivo, toques curtos, chutes certeiros, fortes, indefensáveis. Algum clube no mundo, atualmente, ignoraria um jogador assim? Não há mais do que meia dúzia com tais atributos à disposição dos multimilionários salários pagos hoje em dia a esses atletas.

Mas Saruê jogava em Mossoró, na primeira metade do Século XX. Sua arte, por mais deslumbrante, chegaria a ser conhecida, na melhor das hipóteses, em Natal ou Fortaleza, cujos clubes também utilizavam, geralmente, a prata da casa, jogadores nativos ou residentes nessas cidades. Futebol não era o grande negócio. Era diversão. Profissão era outra coisa. Jogava-se por amor e esse não faltava aos torcedores do Centro Sportivo Mossoroense para com seu grande craque.

Pobre, o cidadão Osmídio Ferreira nem o nome de batismo recuperou. Seria sempre o Saruê para os que o viram jogar e para os que ouviram falar. Circulando nos arredores do Mercado Central, inconfundível com seus cabelos de fogo, expressão conformada com o que restava de reconhecimento da glória passada, atitude dependente de alguma ajuda que viesse espontaneamente, assim seguiria sua vida de ex-ídolo.

Estivesse hoje por aqui, poderia experimentar a grande frustação de não ter nascido no final do Século XX. De não estar, como diz o clichê, na hora e lugar certos. Mas, foi poupado dessa tristeza. As circunstâncias, no tempo em que ele protagonizou o espetáculo mágico do futebol, nem de longe permitiam suspeitar que tal habilidade elevaria alguém a celebridade mundial e, menos ainda, à opulência financeira, do dia para a noite.

E, se o que os olhos não veem, o coração…bem, é só outro clichê, a Saruê, na sua simplicidade, podem ter sido suficientes as emoções e alegrias vividas em campo e refletidas na face dos torcedores; a admiração da cidade toda que seu nome inspirava, enquanto viveu. Para ele, era aquilo mesmo que o esporte poderia ter lhe dado e possivelmente estava feliz com esse prestígio que sabia ser reservado a poucos que, como ele, suavam nos campos de futebol em prol das cores de seus clubes, sem outras expectativas além de uma taça que seria exibida na sede da agremiação. Desse ponto de vista, Saruê, vivendo e jogando em Mossoró pelos idos de 1936, esteve sim, no lugar certo e na hora certa.

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