Ministério Público

Trabalho de resolução de conflitos tem mais de 60% de acordos

Esse resultado mostra a força transformadora da Justiça Restaurava na gestão de conflitos

Por Márcio Alexandre

O Portal do RN inicia nesta quarta-feira, 23/10, série de reportagens sobre o trabalho de prática de Justiça Restaurativa desenvolvido pelo Ministério Público do Rio Grande do Norte. Até sexta-feira, 25/10, serão destacados aspectos importantes desse modelo de atuação, dados sobre as atividades desenvolvidas e resultados dessa proposta.

 

Promover a cidadania por meio de práticas de recomposição que se constituam em instrumentos efetivos de pacificação social, resolução e prevenção de litígios, controvérsias e problemas. Essa é a base fundante da Justiça Restaurativa, estratégia de resolução de conflitos que vem sendo executada  pelo Ministério Público do Rio Grande do Norte (MP/RN).

Ainda não há uma definição acabada do termo Justiça Restaurativa, mas o surgimento dessa ferramenta, se deu na prática, para repensar as necessidades que o crime gera.

No dizer de Howard Zehr, “a Justiça Restaurativa requer, no mínimo, que cuidemos dos danos sofridos pelas vítima e de suas necessidades; que seja atribuída ao ofensor a responsabilidade de corrigir aqueles danos, e que vítimas, ofensores e a comunidade sejam envolvidos nesse processo.”

Nessa perspectiva, a Justiça Restaurativa é proposta centrada naquilo que precisa ser curado, no que precisa ser reparado, no que precisa ser aprendido em decorrência do crime. A Justiça Restaurativa, então, olha para o que precisa ser fortalecido para que essas coisas não aconteçam novamente.

Reconhecer que cada um  de nós tem valor para o todo; que cada pessoa tem dignidade e merece ser respeitada é um dos pilares que sustenta a Justiça Restaurativa.

As práticas restaurativas tem sua origem, no âmbito do Ministério Público, a partir de 2012, com a Criação do Núcleo de Justiça Juvenil Restaurativa (NJJR), unidade vinculada às Promotorias de Justiça da Educação da Comarca de Natal/RN.

O trabalho embrionário foi tão exitoso que estimulou a criação do NUPA, órgão do Ministério Público potiguar que vem desenvolvendo ações no campo da Justiça Restaurativa desde o ano de 2017. Com o NUPA, surgiram os Núcleos Locais de Autocomposição, que consistem no agrupamento de servidores e promotores de Justiça de uma comarca ou de integrantes de uma Unidade Ministerial capacitados para aplicar técnicas de enfrentamento adequado de conflitos em seus procedimentos. Atualmente, existem Núcleos Locais de Autocomposição nas unidade do MP/RN em  Natal, Mossoró e Parnamirim.

“Essas unidades desenvolvem seu trabalho utilizando práticas autocompositivas, especialmente, as práticas da Justiça Restaurativa, para promover o diálogo, restaurar relações, apoiar vítimas e responsabilizar ofensores em situações de conflito envolvendo adolescentes autores de ato infracional, pessoas idosas e com deficiência, em ambientes familiares e domésticos, espaços escolares e da rede socioassistencial, no âmbito dos serviços ofertados no campo das políticas públicas setoriais de Educação, Assistência Social e Cultura”, destaca Iracilde Rodrigues do Nascimento, assistente ministerial e membro do Núcleo Permanente de Incentivo à Autocomposição (NUPA) do Ministério Público norte-riograndense.

Os Núcleos Locais atuam em cooperação técnica com universidades públicas e prefeituras municipais para a difusão da Justiça Restaurativa e de suas práticas, bem como de outros mecanismos de solução consensual de conflitos nestes municípios. Os núcleos locais tem como um de seus pontos fortes a capacitação de pessoas para atuar na solução de conflitos nos vários espaços de convivência, como escolas, conselhos escolares, denotando o aspecto educativo da proposta.

A ideia de justiça restaurativa a partir desse trabalho de mediação de conflitos tem oferecido resultados importantes. Janeiro a junho desse ano, os três núcleos locais de autocomposição de Mossoró, Natal e Parnamirim realizaram 171 práticas restaurativas. O percentual de acordos também é motivo de muita comemoração.

O Núcleo de Justiça Juvenil Restaurativa (NJJR) da Comarca de Natal, por exemplo, catalogou, em 2019, o encaminhamento de 31 casos. Deles, 61,11% foram solucionados por meio de acordos celebrados entre as partes por meio da prática restaurativa. Além disso, o órgão também desenvolveu outras 18 práticas restaurativas, atendendo, de forma direta 76 pessoas, e realizou 114 encontros restaurativos.

“A Justiça Restaurativa e as suas práticas têm um ritmo próprio. O ritmo das pessoas. Ficamos felizes quando os acordos são pactuados e cumpridos, mas construir um espaço seguro para que as pessoas que estão em conflito se encontrem e dialoguem é mais importante do que aquilo que elas possam vir construir juntas depois. Nem sempre é possível dimensionar o impacto positivo que um diálogo em Círculo gera em suas vidas. Os números nem sempre alcançam isso. O NUPA já vem problematizando essa questão internamente e buscando construir indicadores de efetividade restaurativa em relação às práticas executadas dentro da instituição”, argumenta Iracilde Rodrigues.

Além dos núcleos locais, recentemente foi criado o Núcleo de autocomposição em Matéria de Família da Comarca de Natal, que atua na situação de conflito na área de família, por meio de técnicas da mediação, da Justiça Restaurativa e abordagem da Comunicação Não Violenta, em casos de investigação de paternidade, objeto do Programa ‘Pai Legal’, com vistas a potencializar a resolutividade extrajudicial na  área.

O NUPA também fomenta e apoia a disseminação de outros mecanismos autocompositivos (negociação e mediação, por exemplo). O trabalho assumiu uma dimensão tão ampla que também foram criados Núcleos Estaduais de Conciliação e Negociação e também de Mediação em Ilícitos Tributários.

 

Círculos Restaurativos são momento de autoconhecimento e crescimento pessoal

Professora Márcia Núbia, de Mossoró, exalta a formação sobre círculos restauradores

A proposta de Justiça Restaurativa desenvolvida pelo Ministério Público do Rio Grande do Norte (MP/RN) é efetivada por meio de várias ações: além de procedimentos para realização de conflitos, e encaminhamento de soluções de problemas, uma das ações mais importantes vem do campo educativo. Trata-se do processo de capacitação de agentes multiplicadores das práticas restaurativas.

No decorrer de 2019, foram realizadas 12 atividades de formação em Justiça Restaurativa e Práticas Restaurativas, sendo 5 (cinco) capacitações de ateá 12h/a; 2(dois) cursos com carga horária entre 12 e 30h/a, e 5 (cinco) cursos com mais de 30 horas-aula. Essas capacitações aconteceram nos municípios de Parelhas, Natal, Mossoró e Parnamirim.

A formação em Círculos Restaurativos é uma capacitação que promove nos participantes momentos de autoconhecimento, ressignificação de conceitos, exercício de atos de resiliência e oportunidade de crescimento pessoal.

Para Márcia Núbia da Silva, professora da rede municipal de ensino de Mossoró, a formação para facilitadores de círculos de Justiça Restaurativa foi muito importante porque deu aos participantes elementos que apontam para a construção de uma cultura de paz nas Unidades Educacionais, construindo um clima escolar positivo.

Segundo ela, os círculos  são de fundamental importância, especialmente nesse momento histórico, pois propiciam e priorizam o diálogo como forma de entendimento, o que favorece a convivência saudável entre as pessoas, sejam elas crianças, jovens ou adultos.

“É uma formação muito especial. Realizamos atividades de fortalecimento pessoal que nos encoraja não só a multiplicar a ideia de justiça restaurativa, mas de seguir a vida com entusiamo, com felicidade e propaganda cultura de paz”, destaca Márcia Núbia.

De acordo com relatório de ações do NUPA, o Círculo Restaurativo é um processo através do qual todas as partes envolvidas em um ato que causou ofensa reúnem-se para decidir coletivamente como lidar com as circunstâncias decorrentes desse ato e suas implicações para o futuro.

Os círculos restaurativos são encarados pelos participantes como uma oportunidade para que a injustiça seja reconhecida, a igualdade restaurada e o futuro iluminado, de modo que as partes envolvidas se sintam mais seguras, capazes de respeito, empoderadas e cooperativas em relação aos outros e à sociedade.

O Círculo Restaurativo favorece o processo de conscientização, em especial de adolescentes envolvidos em ato infracional, pois oferece a eles a possibilidade de compensar o dano causado sem ser rotulado como criminoso. O Círculo Restaurativo surge como uma ferramenta de auxílio à criação de um novo paradigma acerca do tratamento de situações de conflito.

O círculo restaurativo é um processo que se constitui em um procedimento voluntário e cooperativo, que encoraja o ofensor a aprender novas formas de atuar e de se colocar na comunidade. A proposta requer o cumprimento de etapas de preparação, desenvolvimento e fechamento como um processo que pode ser caracterizado como um desarmamento simbólico das pessoas em que, enfatizando valores fundamentais, contribui efetivamente, na garantia dos direitos correspondentes, promovendo igualdade, educando para relações pacíficas fundidas na participação democrática, na tolerância e na solidariedade, num contexto em que todos partilham livres e abertamente as informações.

Notícias semelhantes
Comentários
Loading...
Page Reader Press Enter to Read Page Content Out Loud Press Enter to Pause or Restart Reading Page Content Out Loud Press Enter to Stop Reading Page Content Out Loud Screen Reader Support