Há coisas que permanecem, embora a impressão é que tenham desaparecido, pelo fato de terem mudado de nome. Na maior parte das vezes isso decorre apenas de modismos, mas não é incomum que o motor da mudança seja o interesse comercial, ou mais diretamente, a intenção de ganhar dinheiro convencendo o consumidor que está comprando algo novo mediante simples troca de rótulo. A evolução da linguagem é processo natural. Ela se modifica em associação com todas as transformações que fazem a história da humanidade. E justamente por essa identidade com o humano, não deixaria de incluir o oportunismo e a boçalidade.
Uma das áreas mais “criativas” na invenção de termos novos para designar coisas antigas são os esportes, particularmente o futebol. Nesse caso, o propósito pode ser somente parecer moderno ou pelo menos não ser arcaico. Daí o desaparecimento dos “laterais” que continuam lá fazendo a mesma função, mas são chamados de “alas”, termo importado, me parece, do basquete. Do mesmo modo não há mais pontas (direita e esquerda), mas jogador que joga pelos lados. O “centro-avante” não é mais o mesmo porque é chamado de “falso nove” (não confundir com um 6 de cabeça para baixo). O companheiro de equipe não “dá o passe” para o artilheiro fazer o gol. Ele faz “uma assistência”. Tem também os eufemismos. Tocar a bola de uma lado a outro, segura-la com o goleiro e outros recursos apenas para esperar que o tempo passe sem que haja jogo de fato, quando se está ganhando, era “fazer cera”, mas agora é chamado de “valorizar a posse de bola”. Tentar enganar o árbitro com ardis desonestos é “usar a experiência”.
Uma troca de nomes para vender produto velho como novidade é o tem ocorrido no mercado musical. O velho brega continua com esse nome para quem gosta de brega. Mas as novas gerações compram as mesmas composições de melodias simples e letras derramadas de mágoas de amor com a denominação de “sertanejo” e o fazem com satisfação e sensação de estar realmente diante de um novo gênero de música. A ideia foi substituir a temática essencialmente rural da música dita caipira por aquela que inspirou o repertório de Waldick Soriano, Roberto Müller e outros
Na generalidade da vida diária “animal de estimação” virou “pet”, bodega transformou-se em “conveniência”, entrega em domicílio passou a ser “delivery”, ninguém faz exercícios físicos, todos vão à academia para malhar, não se faz uma impressão e sim um “print”. E foi nessa pisada que até os conhecidos boateiros ou fofoqueiros perderam a identidade porque já não há mais boatos, mas “fake news”. “Feike”, para os íntimos.