Na crise que se aproxima, algumas sugestões aos futuros prefeitos
POR: FRANCISCO CARLOS CARVALHO DE MELO
A política fiscal desenhou mais uma crise econômica, na qual o conjunto da população sofrerá seus efeitos nefastos, a exceção dos rentistas, poucos no contexto nacional. Será apresentada uma brevíssima análise dessa conjuntura, sugerindo-se algumas recomendações aos futuros gestores municipais. Por esse relato, os prefeitos eleitos em 2024, devem preparar as administrações para os tempos difíceis que se desenham.
Na raiz, o Brasil não tem um problema cambial devido a elevadas reservas em moeda estrangeira. Ao mesmo tempo um Banco Central independente assegura boa gestão da política monetária. Contudo, o país tem um enorme problema fiscal. A equipe econômica do Governo Lula sabe disso, tanto que já propôs dois pacotes de equilíbrio fiscal. Embora insuficientes e destinados ao fracasso, essas medidas fiscais encontram forte reação contrária da ala “desenvolvimentista” do governo, sempre disposta a apostar na fórmula que levou a recente crise de 2016, por exemplo.
O problema fiscal brasileiro é tão grave, que neste dia 16 de dezembro, títulos da dívida pública foram negociados a taxa de 15,39% ao ano, para vencimento em 1º de janeiro de 2027. Sinal de que haverá mais desvalorização do Real, mais elevação dos juros e, por óbvio, redução do crédito, do investimento e queda nos níveis de emprego e renda.
Enquanto isso, a astronômica dívida pública continua crescendo, alimentando artificialmente o crescimento do PIB, o número de empregos e a crédula euforia dos desavisados. Não é à toa que se registra a maior fuga de capitais desde 2020 (pandemia), com a cotação do dólar batendo a casa de R$ 6,208, podendo chegar a R$ 7,00 até 2027 e, pior, com fortes expectativas inflacionárias.
O imprevidente presidente Lula, confunde causa com consequência: “ninguém nesse país tem mais responsabilidade fiscal do que eu”, disse, para espanto e descrença. Para Lula, o problema é a taxa de juros e o mercado financeiro. Seu negacionismo econômico não reconhece que os juros sobem por causa do déficit e o mercado precifica o risco e o custo futuro do dinheiro. Como resultado, o povo, “que não compra dólar, compra comida”, em breve sentirá os efeitos da sua alta nos alimentos e nos remédios, por exemplo.
Nesse contexto, com 34 anos de experiência no serviço público municipal, trinta deles concomitante ao ensino de economia e gestão pública no ensino superior, me permito um lembrete para os prefeitos eleitos em 2024: Acautelai-vos. O município é o ente federativo mais frágil. Nas crises econômicas, é o ente mais penalizado com a queda nos repasses e aumento dos custos de insumos e serviços. Na pandemia de COVID-19, uma crise primeiramente de caráter sanitário, ocorreu um raríssimo alívio financeiro para estados e municípios em contexto de crise.
Para contribuir com o debate, apresentarei três exemplos que testemunhei em minha aldeia, Mossoró/RN. No governo de Dix-Huit Rosado, a Lei Kandir (1996/97) solapou um município já fragilizado por problemas político-gerenciais internos, provocando a maior crise já vista na Prefeitura de Mossoró e condenando um grande governante a um final melancólico. Poucas vezes se viu uma luta política tão fraticida.
O final do primeiro governo de Fafá Rosado, por sua vez, foi impactado pela crise denominada por Lula de “marolinha” (2008/2009). Os efeitos da quebra do banco Lemom Brothers desencadearam uma crise global que chegou ao nosso município reduzindo as receitas e exigindo duras e corajosos medidas administrativas. A difícil escolha de colocar o ajuste da gestão à frente dos projetos políticos contrariou interesses, inclusive de correligionários, fortalecendo uma articulada oposição política e midiática. Fafá enfrentou e concluiu um exitoso e bem avaliado governo, embora com reduzido alcance político. Nas crises e na política, é melhor não esperar apoio ou solidariedade, muito menos reciprocidade.
Entre 2014/16, uma crise que foi desenhada pegou o governo de Francisco José Jr de supetão, em meio a maior recessão da história brasileira. Questões gerenciais à parte, a redução dos repasses exigia medidas austeras, não adotadas devido aos objetivos políticos. A consequente precarização dos serviços e a atuação de um movimento oposicionista multipolar e audacioso, embora desarticulado, provocou um final de governo desastroso, difícil de ser imaginado no início daquela gestão. Uma jovem e promissora carreira política sucumbiu pela ousadia extemporânea e, talvez, falta de espírito público.
Estamos completando oito anos desde a última crise econômica e os ventos que vêm do Sul, já sopram forte para formação de uma nova tormenta. Todos os futuros prefeitos devem observar os sinais dos tempos e iniciar suas gestões acautelados. Como opções político-administrativas, sugiro um início com austeridade em busca de solidez financeira, concluindo obras iniciadas, adiando a ampliação dos serviços e focando na melhoria e eficiência dos serviços já instalados. A redução custos devem ser concomitante ao investimento na formação, capacitação e valorização de equipes e desenvolvimento de instrumentos próprios de monitoramento, avaliação e premiação por desempenho. O estímulo a elaboração de novos projetos e a formação de parcerias políticas no setor público e privado deve fazer parte dos dois primeiros anos de gestão, pelo menos.
Crises nunca afetam as gestões municipais da mesma forma. Se preparar para os tempos difíceis que se avizinham é sinal de prudência e maturidade política e administrativa. Se o assustador cenário que se desenha não se concretizar, nada terá sido perdido. Restará uma gestão fortalecida para realizar muitas entregas e colher os merecidos dividendos políticos e eleitorais.
FRANCISCO CARLOS CARVALHO DE MELO – Dr. em Administração pela PUC-PR, professor de economia (UERN), professor do Mestrado em Administração Pública (UFERSA), autor de livros e artigos em revistas nacionais e internacionais. Ex-secretário municipal e ex-vereador por três mandatos, quatro vezes escolhido o vereador em Mossoró/RN.