O técnico Cuca deixou o comando do Corinthians com apenas duas partidas. A decisão foi anunciada após a partida contra o Remo, nesta quarta-feira, quando o Timão venceu nos pênaltis e carimbou a classificação para as oitavas da Copa do Brasil.
– Eu saio neste momento, não é pelo o que eu queria. Se espera uma vida inteira para estar aqui. É um pedido da minha família. “Pai, vem, estamos precisando”. Amanhã estou em casa, vou cuidar de vocês – disse Cuca, em breve pronunciamento.
Ainda no campo, ele foi abraçado por todos os jogadores. O presidente Duilio Monteiro Alves lamentou a saída, disse que Cuca vem sofrendo um “massacre” e já iniciou a busca por um novo comandante.
A passagem de Cuca pelo Corinthians durou menos de uma semana. Ele foi anunciado como substituto de Fernando Lázaro na última quinta-feira e fez a estreia no domingo, em derrota por 3 a 1 para o Goiás, fora de casa, pela 2ª rodada do Brasileirão.
Desde sua chegada o técnico foi alvo de protestos de parte da torcida do Timão, que não aceitou a contratação de um condenado por estupro em 1989, na Suíça. A diretoria dizia acreditar na inocência do treinador, que assim se declara.
Cuca disse ter sofrido muita pressão nos últimos dias, inclusive afirmando que a decisão de deixar o cargo se deu na terça-feira, antes do jogo contra o Remo.
– E antes desse sonho se realizar, tiveram três, quatro dias muito pesados para mim. De pesadelo. Foi quase um massacre o que acabou acontecendo. Eu estava muito concentrado nessa decisão, não queria tirar o foco. E isso acaba levando para os jogadores. Hoje me emocionaram. Estou aqui há cinco dias, mas todos ofertaram para mim. Eu não pedi nada, mas eles sentiram, como ex-atleta que sou, o que estou passando. O que estou passando, e quero ser bem breve, porque não quero ser vítima de nada, é a pior coisa que um homem pode passar. Quando está em xeque a dignidade dele. Quando invade as redes sociais das filhas e mulher com ameaças e ofensas descabidas.
– Chega um momento em que, sinceramente… Eu vou fazer 60 anos no mês que vem, você pesa o que vale e o que não vale a pena na vida. Neste momento, quero fazer valer a pena minha família, a coisa mais importante que tenho no mundo. Não esperava a avalanche que aconteceu aqui. São coisas já passadas há muito tempo, ressurgidas como se tivessem acontecido hoje. Fui julgado e punido pela internet, entre aspas. Isso tem uma consequência muito grande.
Nesta semana, o técnico teve parte do seu discurso desmentido pelo advogado da vítima. Cuca dizia que por três vezes não havia sido reconhecido por ela como um dos abusadores. A versão foi rebatida pelo suíço Willi Egloff. Diante disso, Cuca contratou advogados e tentará se provar inocente na Suíça.
– Contratei o Doutor Daniel Bialski, criminalista, a Doutora Bia, que vão fazer todo o trabalho que eu nunca pude fazer. Agora vai ser feito. Quem fala coisas indevidas também, quem julga também pode ser julgado, mas o mais importante é agradecer o presidente. É uma pessoa maravilhosa. Eu conversei com ele, já tinha tomado essa decisão ontem. Ele vive ali dentro, como se fosse mais um, humilde, e eu estava prejudicando ele. A pressão que ele está sofrendo é enorme.
– Então não é justo deixar eles sofrendo por um problema que é meu. É nisso que foi baseado essa saída minha. Agradecer aos jogadores nesses sete dias que estive aí, me abraçaram, compraram o meu barulho, minhas ideias. Se Deus quiser, volto um dia para poder fazer um trabalho do começo ao fim – completou Cuca.
A saída precoce de Cuca chegou a ser aventada no começo da semana, mas inicialmente ele rechaçou essa possibilidade. Nos últimos dias, o clube teve protestos na porta do CT Joaquim Grava, na porta do Parque São Jorge e também manifestações internas.
O próximo jogo do Corinthians é o clássico contra o Palmeiras, sábado, no Allianz Parque, pelo Brasileirão. Fernando Lázaro, que está na comissão fixa, pode comandar o time novamente.
O escândalo de Berna
O caso teve início em 1987, quando o Grêmio fazia excursão pela Europa. Cuca e outros três atletas foram detidos com a alegação de terem tido relações sexuais com a garota sem consentimento.
Segundo a investigação da polícia local, a jovem se dirigiu com amigos ao quarto dos jogadores do Grêmio. Os atletas, então, a puxaram para dentro e a abusaram.
Os quatro ficaram cerca de um mês presos antes de voltarem ao Brasil. O julgamento aconteceu só dois anos depois.
Cuca, Eduardo e Henrique foram condenados a 15 meses de prisão por atentado ao pudor com uso de violência. Fernando foi absolvido da acusação de atentado ao pudor e condenado por estar envolvido no ato de violência. Como o Brasil não extradita seus cidadãos, eles nunca cumpriram a pena.
Em entrevista ao “Esporte Espetacular” em janeiro de 2021, o então vice jurídico do Grêmio, Luiz Carlos Martins, o Cacalo, afirmou que apenas um dos jogadores teve relação sexual com a jovem, de maneira consentida. Porém, a lei previa que a relação seria estupro presumido, pela idade da menina.
Cuca nega que tenha cometido o estupro.
– Esse é um tema delicado, um tema pessoal meu. Eu faço questão de falar sobre ele, e vou tentar ser o mais aberto possível quanto a isso, quanto ao que me cabe. É um tema que aconteceu há 30 anos, em 1987, eu fazia, não sei ao certo, estava emprestado do Juventude ao Grêmio, fiquei uns 20 dias para tirar o passaporte. Tenho vaga lembrança de tudo o que aconteceu porque foi há muito tempo. Nessa vaga lembrança que tenho, eu tinha 20 e poucos anos na época. Nós iríamos jogar uma partida, subiu uma menina ao quarto, o quarto era o que eu estava junto com outros jogadores. Era um quarto duplo. Essa foi a minha participação nesse caso. Eu sou totalmente inocente, eu não fiz nada – disse Cuca, ao ser apresentado no Corinthians, na última sexta.
Fonte: Globo Esporte