AS TARTARUGAS DA PRAÇA
Elas viviam muito tranquilas, zanzando vagarosamente de um lado para outro dentro da piscina circular no centro da Praça Vigário Antonio Joaquim, a Praça da Catedral de Mossoró. Certamente eram espécies de água doce, e ainda mais seguramente, não eram mossoroenses de origem. Pelo menos não consta que nossos rios fossem berços naturais desses quelônios aquáticos. Tartarugas têm fama de serem lentas. É provável que devam essa fama a seus primos, os jabutis, quelônios terrestres dotados de anatomia mais que desfavorável para se movimentarem nesse meio enquanto elas, as tartarugas, vivem quase todo tempo dentro d’água, onde são ágeis. Já os movimentos preguiçosos daquelas habitantes da praça são explicáveis: não tinham mesmo para onde ir com pressa, limitadas que estavam aos pouco mais que três metros de diâmetro do tanque construído pela prefeitura, talvez no tempo do Padre Mota, para realizar seu ir e vir, ignoradas pela maioria dos transeuntes, mas sob o olhar vigilante da estátua do Governador Dix-sept Rosado e objeto da atenção das crianças, que não costumavam ver um bicho daqueles por qualquer lugar.
Ao que se recorda, era o único lugar da cidade em que havia um tipo de animal como atração de uma praça. Também, pelo que se sabe, viveram muitos anos (outra fama das tartarugas) aquelas convivas dos frequentadores da praça, o que, supõe-se, indicava que mesmo retiradas de seu habitat para permanecer naquele aquário ao ar livre, eram bem tratadas, ou seja, recebiam do poder municipal a devida atenção às suas necessidades naturais, exceto a liberdade de espaço. Hoje, depois de muitas reformas, no centro da Praça da Catedral as águas cercam a estátua do governador, mas as tartarugas já não estão lá. Entretanto, no entorno, as luminárias de estilo colonial, em forma de globo, no auto dos postes, trazem (ou procuram trazer) a lembrança da imagem original do logradouro outrora chique da convivência do centro da cidade e seus cinemas, bares, lanchonetes, sorveterias, igrejas e residências.
É claro que aquele simples, despretensioso tanque e suas tartarugas estavam longe de significar algo marcante em termos de arquitetura urbanística. Mas não seria demais se algum artista local pintasse um quadro que adequadamente integrado ao ambiente atual, em um lugar ao lado do espelho d’água que permanece, embora com outro formato, lembrasse (com breve texto explicativo), da mesma forma singela que os caracterizava, os antigos bichinhos que nadavam dia e noite ali, compondo a paisagem e concertando com o espírito dos tempos que fluíam devagar, assim como aqueles répteis de formato curioso, quando saem da água e se aventuram nas areias das margens de mares e rios.