Falha da rede básica superlota Tarcísio Maia
De 15.729 atendimentos realizados entre janeiro e julho, mais de 10 mil deveriam ter sido feitos nas UPA´s e UBS´s
A falha na rede primária de saúde sempre foi apontada, na maioria das vezes pelo senso comum, como a grande responsável pela superlotação do Hospital Regional Tarcísio Maia (HRTM), em Mossoró. Dados do Serviço de Atendimento Médico e Estatística (SAME), do HRTM, a que o Portal do RN, teve acesso comprova o que antes era apenas uma suspeição.
Os números apontam que de primeiro de janeiro a 24 de julho de 2019, o HRTM realizou nada menos que 15.729 atendimentos. Desses, 10.047, nada menos que 63.8%, foram atendimentos realizados a pessoas que deveriam ter sido atendidas na rede básica, ou seja nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) ou nas Unidades de Prontos Atendimento (UPA´s). O HRTM é hospital de referência em alta complexidade, sendo de sua competência os pacientes cujos atendimentos são classificados como de urgência e/ou emergência.
Se tivesse realizado apenas os atendimentos que são de sua competência, o HRTM teria atendido apenas 5.682. “Esse é um número que revela a demanda para a qual o hospital está realmente preparado”, analisa a diretora geral do HRTM, assistente social Herbênia Ferreira. Na prática, a presença de pacientes que não são de sua competência fez com que o hospital tivesse uma demanda quase duas vezes superior a que ele deveria ter atendido.
Os números apontam ainda que a cidade de Mossoró lidera em número de pacientes que deveriam ter sido atendidos na rede básica e que foram encaminhados para o Tarcísio Maia. Para se ter uma ideia de como o atendimento na rede primária de Mossoró está deficiente, somente em julho nada menos que 1.974 pacientes que deveriam ter sido atendidos ou em UBS´s ou UPA´s mossoroenses deram entrada no HRTM. “É humanamente impossível se atender de forma correta e humanizada com uma disparidade dessa”, afirma Herbênia Ferreira.
Além de Mossoró, Assu, Areia Branca, Baraúna, Apodi, Caraúbas, Governador Dix-sept Rosado, Ipanguaçu, Grossos e Tibau completam a lista dos 10 municípios que mais enviam pacientes para o Tarcísio Maia quando deveriam atendê-los por meio de suas redes básicas. “Mandam para cá pessoas com problemas simples que a UBS resolveria em pouco tempo. Isso faz com que tenhamos que mobilizar uma grande estrutura para atender procedimentos básicos. É também um desperdício de dinheiro público”, acrescenta Herbênia Ferreira.
Para mudar esse cenário, a direção do hospital tem adotado algumas medidas. Uma delas foi revitalizar o Núcleo Interno de Regulação. Por meio dele, um médico fica responsável por fazer a triagem das demandas que chegam e encaminhar cada uma delas para a unidade competente. “Se é um paciente de procedimento de UBS, mandamos para a UBS. Se é de um hospital do interior, mandamos para lá”, explica a gestora.
Herbênia Ferreira conta que antes de iniciar esse processo, se reuniu com o Ministério Público para mostrar a realidade, explicar as causas dessa superlotação e apresentar as medidas necessárias a serem tomadas. “Também nos reunimos com diretores dos hospitais regionais e municipais das cidades próximas a Mossoró para sensibilizar e conscientizar sobre a importância de que cada um cumpra seu papel no atendimento primário”, informa Herbênia Ferreira, acrescentando que visitou as cidades que tem hospitais para verificar in loco a situação de cada um e descobriu em muito deles número de pacientes muito abaixo do que podem atender. “Assu, que tem um hospital regional, mandou para o Tarcísio Maia, e julho 281 pacientes. No dia em que estivemos no hospital de lá, havia apenas 7 pacientes”, relata.
A diretora conta ainda que também foram alterados outros procedimentos, como por exemplo, constante avaliação da situação dos pacientes. “Analisar a evolução do paciente nos dá a condição de diminuir o tempo de hospitalização. Com isso, os recursos hospitalares ficam disponíveis em menor espaço de tempo para que possam atender a outros pacientes”, aponta.
Herbênia Ferreira diz que a população tem entendido as novas medidas e não tem se registrado problemas quando eles são orientados a buscar atendimento em uma UPA, UBS ou no hospital de sua cidade de origem. “As pessoas não eram conscientizadas sobre a gravidade ou não do problema que o afligia e também não sabiam qual era a obrigação ou competência de cada tipo de unidade hospitalar. Ao ter essas informações, elas compreendem a situação, até porque a maioria das pessoas querem ser atendidas mais perto de suas casas ou em sua cidade de origem”, argumenta.
A diretora do HRTM relata que as novas medidas tem surtido efeito, principalmente na redução n o número de pessoas nos corredores do hospital, sendo atendidas ou esperando atendimento. A reportagem do Portal do RN esteve nesta terça-feira, 10/9, no Tarcísio Maia, visitando leitos, enfermaria, corredores, setores médicos, de internação, de realização de exames. Verificou inclusive a existência de vagas em enfermarias, alguns leitos vazios, bem como espaços sem pacientes em locais de repouso ou de realização de procedimentos médicos. “Após consolidar essa nova realidade, vamos trabalhar para melhorar a qualidade dos serviços prestados”, finaliza Herbênia Ferreira.